Filhos saindo cada vez mais tarde de casa, pais cada vez mais longevos. Há seis anos, essa combinação fez com que Adriana Faustino, de 50 anos, se visse sobrecarregada, tendo que cuidar da mãe idosa e do filho pequeno. Marcus Vinícius tinha 1 ano quando a mãe de Adriana foi diagnosticada com Parkinson e demência. Adriana conta com uma rede de apoio de fisioterapeutas, geriatra, e divide as responsabilidades com os irmãos.

“Eu e minha irmã sabemos levar bem essa situação. Procuramos dividir com os irmãos para termos lazer também e sabemos lidar com ela sem brigas. Concordamos com tudo que ela diz, sabemos separar o que é da demência e sabemos quando o que ela diz é real”, explica. “Nosso maior desafio é quando ela entra em surto”, conta.


Peso psicológico e financeiro

A realidade de Fernanda Manzo, 45 anos, é diferente. Filha única, ela também cuida da mãe, mas não tem suporte financeiro para pagar cuidadores e não tem irmãos ou parentes para dividir as responsabilidades. “Minha mãe me ajudou com minha filha até os 3 anos de idade. Ela ficava com a criança para que eu pudesse trabalhar. Depois que foi diagnosticada com Alzheimer tudo se inverteu. Além de não ter mais ninguém para me ajudar com minha filha, preciso cuidar dela também. Tive que me mudar para a casa dela, pois tentei trazê-la para minha casa, mas ela não reconhecia o lugar e entrava em crise”, diz.

Não há dados no Brasil sobre esse fenômeno, mas uma pesquisa feita nos Estados Unidos pelo centro Pew, indicou que um a cada quatro adultos americanos se encaixa na geração sanduíche, tendo responsabilidades com pais e filhos. Mais da metade (54%) deles está na faixa dos 40 anos.

Além da longevidade dos pais e das pessoas estarem tendo filhos cada vez mais tarde, as famílias estão menores, com menos pessoas para dividirem as responsabilidades.

De acordo com o IBGE, em 2019, dados da Pesquisa Nacional por Amostras de Domicílio Contínua (Pnad Contínua) apontam que 54,1 milhões de brasileiros com 14 anos ou mais cuidavam de outros moradores da sua casa ou de outros parentes, mas não havia dados sobre cuidados com duas gerações ao mesmo tempo.

“Minha mãe foi morar com a minha irmã e nos finais de semana cada filho fica com ela, para minha irmã ter uma folga e sair”, explica Adriana. “Já são 15 anos nesse esquema de cuidados”.

Mulheres são as mais “ensanduichadas”

Embora os dados não sejam muito precisos no Brasil, Simone Wajnman e Jordana Cristina Jesus, em um estudo sobre o tema, demonstram que as mulheres são mais propensas a ocuparem esse papel de cuidadoras.

O IBGE aponta que as mulheres dedicam 10,4 horas por semana a mais do que homens às tarefas domésticas e aos cuidados não remunerados com pessoas.

Essa sobrecarga tem um preço para a saúde mental. Fernanda passou por períodos de depressão. “Não tenho tempo para lazer, viagens, nada. Além dos cuidados com mãe e filha, ainda preciso trabalhar e cuidar da casa”.

Uma pesquisa da Universidade de Michigan, nos EUA, apontou que 36% da geração sanduíche apresenta problemas financeiros e 44% por problemas emocionais.

Cuidar da saúde mental é preciso

Mesmo em meio ao caos, a recomendação de psicólogos é que a saúde mental não seja deixada de lado. “Praticar esportes, mesmo que seja uma caminhada, procurar grupos de apoio, tentar encontrar um tempinho para assistir um filme que goste. Pode parecer impossível, mas é necessário”, indica a psicóloga Karina Silva.

Um dos autores do estudo estadunidense, Donovan Maust, aponta que, para isso, “formuladores de políticas públicas e empregadores deverão prestar atenção especial aos indivíduos nesse ‘trilema’ de cuidar de duas gerações e, ao mesmo tempo, continuar sendo parte da força de trabalho”.

“É preciso pensar em políticas públicas para aliviar a carga social, emocional e financeira sobre quem cuida”, defende Karina.

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