À frente das healthtechs, mulheres têm papel essencial na busca pela democratização do tratamento psicológico no Brasil

Com aumento dos problemas de saúde mental, impulsionados principalmente pela pandemia de Covid-19, o mercado mundial das startups do segmento de saúde cresceu e tem atraído cada vez mais capital
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Recentemente, a startup norte-americana Spring Health, fornecedora de soluções em saúde mental, recebeu um aporte de US$ 190 milhões, o que elevou sua avaliação para US$ 2 bilhões e lhe deu o título de unicórnio – como são chamadas as empresas que ultrapassam US$ 1 bilhão. A healthtech – denominação das startups do segmento de saúde -, é comandada pela jovem April Koh, 29 anos, cofundadora ao lado de Adam Chekroud. A operação também garantiu à empreendedora o posto de mais jovem CEO de uma startup bilionária. De acordo com a “Forbes”, ela ultrapassou a CEO da Shippo, Laura Behrens Wu, seis meses mais velha.

Quando ainda era estudante na Universidade de Yale, April viveu situações que a fizeram perceber como era difícil encontrar ajuda para tratar doenças mentais. Ela buscava soluções para os seus problemas e os de uma amiga, mas nada parecia funcionar. “Havia uma proliferação louca de todos esses aplicativos e soluções que afirmavam ajudar as pessoas com sua saúde mental. E não havia orientação nenhuma sobre qual recurso, aplicativo ou terapeuta era mais indicado para cada caso”, explicou ela em entrevista à revista.

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Para tentar encontrar uma solução, April se juntou ao médico Adam Chekroud, que tinha a proposta de usar a tecnologia para ajudar os pacientes a encontrarem os melhores profissionais para suas necessidades. Em 2016, eles colocaram a Spring Health em operação. “Temos aconselhamento de relacionamento, saúde mental pediátrica, coaching para pais. Agora estamos construindo uma plataforma onde as famílias podem experimentar o Spring Health juntas.”

O uso da tecnologia para viabilizar soluções e serviços capazes de aplacar o mal do século não é um feito isolado da Spring Health. O mercado mundial das healthtechs com foco em saúde mental ganhou muito espaço desde o início da pandemia de Covid-19. 

Segundo levantamento da CB Insights, o setor atraiu, em 2020, mais de US$ 2 bilhões em investimentos em todo o mundo, praticamente o dobro do volume captado no ano anterior, de US$ 1,12 bilhão. Ainda de acordo com a pesquisa, no Brasil, das mais de 700 startups de saúde, pelo menos 30 são focadas no cuidado mental. Ao longo do último ano, estas empresas arrecadaram um total de US$ 4,7 milhões em aportes, mais do que o dobro de 2019 (US$ 1,85 milhão) e dez vezes o valor de 2018 (US$ 430 mil).

Dados da Organização Mundial da Saúde (OMS) de 2019 (os mais recentes disponíveis) mostram que o Brasil tem a maior taxa de pessoas com transtornos de ansiedade do mundo – 9,3% da população total – e é quinto em casos de depressão, com 5,8% de seus cidadãos acometidos pelo mal. E a situação piorou consideravelmente durante a pandemia.

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Segundo a psicóloga Ana Carolina Peuker, CEO da Bee Touch, a crise sanitária impactou a saúde mental de um número grande de brasileiros. “Cada vez mais ouvimos falar sobre a chamada quarta onda da pandemia, uma referência ao adoecimento mental que, diferente do vírus, não será contido com a vacinação. A OMS já alertou para o aumento da prevalência de transtornos mentais e como isso pode ter impacto a médio e longo prazos, mesmo após o fim da crise sanitária. Isso se agrava ainda mais quando levamos em conta o fato de que o Brasil já era, antes da Covid-19, um país com mais ansiosos no mundo”, destaca a executiva.

Mas o Brasil também tem seus exemplos de empreendedoras que viram no problema uma oportunidade de negócio e de ajuda a outras pessoas. Apesar de apenas 4,7% das startups brasileiras serem fundadas exclusivamente por mulheres, segundo o estudo “Female Founders Report 2021”, realizado pela Distrito em parceria com a Endeavor e a B2Mamy, algumas delas seguem na contramão das estatísticas para melhorar a saúde mental dos brasileiros e principalmente democratizar o acesso aos serviços de ajuda psicológica.

Veja, a seguir, seis mulheres que estão à frente de healthtechs que estão democratizando o acesso a soluções de saúde mental:

Ana Carolina Peuker, da Bee Touch

Ana Carolina Peuker, CEO da Bee Touch (Foto: Morgana Mazzon/Divulgação)

A psicóloga Ana Carolina Peuker é CEO e cofundadora da Bee Touch, startup fundada em 2012, em Porto Alegre (RS), ao lado da mestre e doutora em Ciências Médicas Sibele Faller e do cientista da computação Felipe Scuciatto. Juntos, eles desenvolveram soluções para saúde mental como a Avax Psi, primeira plataforma digital de avaliações psicológicas do Brasil. 

A startup, que há três anos, a Bee Touch recebeu um investimento da Vetor Editora de R$ 750 mil, já contabiliza um crescimento de 75% na comparação entre março de 2020 e março de 2021.

A empresa garante ter um método pioneiro para rastrear riscos psicossociais digitalmente. Assim, análises precisas são oferecidas aos gestores para que estes possam hierarquizar ameaças e priorizar ações em relação aos fatores diagnosticados. 

Desde o lançamento, já foram atendidos mais de 50 clientes corporativos, como a Caixa dos Advogados da OAB de São Paulo, a maior seccional do país, com 280 mil operadores inscritos, a Caixa dos Advogados do Piauí e a do Mato Grosso do Sul. “Nosso primeiro grande cliente foi a Braskem, para quem desenvolvemos um projeto durante seis anos, por meio de uma parceria comercial com o Hospital Moinhos de Vento. Também temos no portfólio multinacionais da área de finanças, metalurgia, telecomunicações e do setor automotivo. No ano passado, comercializamos a AVAX para o SESI de São Paulo, que enxergou em nossa proposta valor para a indústria paulista. Quanto às vidas cobertas, já são mais de 500 mil alcançadas por meio de parceria”, explica Ana Carolina.

A Bee Touch verifica a causa dos problemas relacionados à ansiedade e de saúde mental dos colaboradores, como o ambiente de trabalho, liderança e modelo da empresa, entre outras. “O trabalho da healthtech vai além dos benefícios corporativos, consultas e terapia online. Ela ajuda as empresas a identificarem os riscos psicossociais e terem formas efetivas, baseadas cientificamente, de lidar com esses problemas. Pensar ações e políticas de longo prazo que utilizem a  tecnologia para garantir escalabilidade e práticas baseadas em evidências para aumentar a efetividade das ações constituem um passo importante rumo à sustentabilidade emocional”, acrescenta a CEO.

Milene Rosenthal, da Telavita

Milene Rosenthal, fundadora da Telavita (Foto: Divulgação)

Ao lado de Andy Bookas e Lucas Arthur, Milene Rosenthal fundou a Televita, startup pioneira em terapia via telemedicina em 2018. A ideia sempre foi aumentar os horizontes de alcance e a capacidade de atendimento online dos profissionais de saúde, reduzindo os custos e as barreiras geográficas, com o intuito de democratizar o acesso.

Para colocar a startup em funcionamento foi preciso que os criadores investissem inicialmente dinheiro do próprio bolso. Depois, dois grupos de investidores-anjo dos EUA e da Europa possibilitaram uma captação de mais de R$ 5 milhões. Ao todo, já foram realizados mais de 100 mil atendimentos e a startup cresceu 135% no terceiro trimestre de 2021 em comparação ao mesmo período de 2020. 

“A Telavita vem registrando, desde o início da pandemia, um crescimento acelerado no número de atendimentos e de empresas que buscam nossos serviços para apoiar seus colaboradores por meio da telepsicologia e do nosso programa de saúde mental. Esse é um trabalho de grande relevância social, pois temos a oportunidade de oferecer um acolhimento psicológico para as pessoas que adoeceram, e também de atuar de forma preventiva, estimulando o autoconhecimento e a gestão do estresse”, explica Milene.

Sobre o futuro das consultas online, ela diz que este é um modelo que veio para ficar. “A terapia online já existia antes da pandemia e foi impulsionada por ela. Não tenho dúvidas de que permanecerá agora, pois grande parte da população teve a oportunidade de conhecer como funciona e, ao mesmo tempo, entender que é possível realizar sua psicoterapia a distância com total segurança e a mesma qualidade da terapia presencial.”

Paula Boabaid May, da GnTech

Paula Pedrassani Boabaid, fundadora da GnTech (Foto: Divulgação)

A advogada Paula Pedrassani Boabaid fundou, em 2012, ao lado do psiquiatra Guido Boabaid May, a GnTech, startup que faz testes genéticos que ajudam a tratar doenças como a depressão.

“A partir do momento que a pessoa é avaliada por um profissional e recebe um diagnóstico com uma recomendação de tratamento médico, ela tem a opção de fazer seu tratamento pelo método de tentativa e erro, ou fazer um exame genético que aumenta as chances do seu tratamento ser mais eficaz desde a primeira tentativa. Quem já passou por esse processo sabe o custo emocional e financeiro e consegue perceber com mais facilidade o valor de um exame farmacogenético. A cada tentativa mal-sucedida, as chances da pessoa se tornar um paciente crônico aumentam”, diz Paula. 

Desde o lançamento, mais de 9.000 exames genéticos já foram realizados e a healthtech cresceu, em média, 32% ao ano. Em 2020 não houve crescimento e, para 2021, a expectativa é de 24%. Os fundadores foram os principais investidores, mas, em 2016, a empresa recebeu um aporte de R$ 2,3 milhões.

Renata Tomazeli, da Youfeel Health

Renata Tomazeli, fundadora e CEO da Youfeel Health (Foto: Divulgação)

Renata Tomazeli é fundadora e CEO do Youfeel Health, um aplicativo de cuidados de saúde mental que une tecnologia com atendimento profissional para diagnóstico, tratamento e prevenção de ansiedade e depressão. Psicóloga, decidiu criar a empresa em 2019 depois de chegar à conclusão de que era necessário um novo modelo para atender às demandas da saúde mental no Brasil, que não são poucas.

Na prática, a startup realiza a avaliação clínica somada à análise diária de dados biométricos de sono, atividade física e nutrição, indicativos de ansiedade e depressão. Por meio da análise de dados e algoritmos, a companhia realiza pré-diagnósticos mais precisos e rápidos e direciona o paciente para tratamentos personalizados. Por fim, conecta os usuários com profissionais da saúde e desenvolve planos de ação para cuidados complementares, como atividade física, alimentação, meditação e acompanhamento profissional online.

Até o momento, já foram realizados mais de 2.000 atendimentos e, só no último ano, o faturamento cresceu 175% e o número de usuários 150%. “Quando lançamos a Youfeel fomos ao Vale do Silício para validar nossa ideia em um programa de imersão de startups. Terminamos em primeiro lugar na competição, que contava com outras 16 startups. Isso nos mostrou que tínhamos potencial para evoluir.”

Logo depois, a startup foi acelerada pelo Founder Institute, o principal programa de aceleração de startups early-stage do mundo. “Atualmente, somos residentes do Distrito Inova HC, o maior hub de inovação em saúde no Brasil”, diz Renata. 

Dados da empresa mostram que 42% dos usuários apresentaram evolução no score de saúde mental após três meses de tratamento. “Reduzimos em 75% o índice de afastamento do trabalho por questões de saúde mental e 100% dos nossos usuários estão satisfeitos com o atendimento médico e psicológico que oferecemos.”

Rosângela Casseano, da PsicoPass

Rosângela Casseano, fundadora da PsicoPass (Foto: Divulgação)

Com mais de 30 anos de experiência clínica, a psicóloga Rosângela Casseano decidiu fundar a PsicoPass em abril de 2021. A startup oferece tratamento psicológico para pessoas que precisam de psicoterapia, orientação vocacional e profissional e coaching para quem tem pouca disponibilidade financeira.

Até o mês de setembro 242 pessoas já foram atendidas, entre triagem gratuita e contratação dos serviços em psicologia, coaching e orientação vocacional. Os dados da empresa mostram um crescimento médio entre 55% e 60% no número de triagens e serviços por mês até agosto. 

“O medo da morte por Covid-19, a insegurança quanto a questões financeiras e os conflitos entre as famílias causados pelo excesso de convívio nunca experimentado elevaram significativamente a ansiedade, a depressão e o Burnout. Com isso, as pessoas se mostraram mais abertas a buscar ajuda psicológica. Foi neste cenário que nasceu a PsicoPass”, conta a empreendedora. Ela acrescenta que a healthtech oferece psicólogos especialistas, com pelo menos cinco anos de experiência clínica comprovada, e cursos de capacitação, como doutorado, mestrado, pós-graduação ou especializações.

Tatiana Pimenta, da Vittude

Tatiana Pimenta, fundadora e CEO da Vittude (Foto: Divulgação)

Tatiana Pimenta é CEO e fundadora da Vittude, startup de saúde mental criada em 2016 com o objetivo de democratizar o atendimento psicológico no Brasil. Atualmente, a healthtech tem mais de 3 milhões de pessoas em sua plataforma e, apenas em 2020, impactou mais de 30 milhões de brasileiros.

No final de 2019, a startup recebeu um aporte de R$ 4,5 milhões para investir na ampliação do Vittude Corporate, braço para os serviços corporativos, que já atende mais de 80 empresas nacionais e multinacionais, como o Grupo O Boticário, Raia Drogasil, Alelo, VR Benefícios, Saint-Gobain, SAP e Microsoft. Os projetos englobam avaliações e monitoramento de saúde mental, comportamental, capacitação de líderes, palestras, rodas de conversa e a nossa plataforma tecnológica de terapia online, que ajuda ampliar o acesso a serviços de psicologia.

Também em 2019, a Vittude foi a única empresa brasileira finalista da premiação internacional Cartier Women’s Initiative Awards, tendo recebido um prêmio em dinheiro de US$ 30 mil.

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