“Só interessa contratar mulheres se elas não tiverem filhos e sensibilidade”, diz Dani Verdugo sobre comportamento de algumas companhias

CEO da THE Consulting aponta a importância de as empresas aceitarem as características femininas em sua totalidade
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Dani é CEO da THE Consulting (Foto: Reprodução/LinkedIn)

Há mais de 20 anos no mercado de recrutamento, Dani Verdugo é headhunter, mentora e conselheira. Desde 2017, também é a fundadora e CEO da THE Consulting, “boutique” voltada para a seleção de altos executivos, como ela mesma define. Utilizando uma metodologia própria que preza pela qualidade e assertividade da seleção, a empreendedora atualmente atende marcas como Cacau Show, C&A e Dasa. 

Para ela, os profissionais que desejam conquistar posições de destaque devem ir além de um histórico cheio de experiência. “Antes, os funcionários eram contratados pelo currículo e demitidos pelo comportamento”, diz. Atualmente, a consultora preza muito mais pela compatibilidade entre colaboradores e empresas, de forma que tanto os valores quanto a cultura sejam compartilhados, do que pela vivência propriamente dita. “Nem sempre a companhia que eu acho ‘legal’ é alinhada aos meus princípios, e isso é primordial no momento de escolha de carreira”, afirma.  

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No caso das mulheres, isso é ainda mais importante. Seja no mercado de trabalho ou durante processos seletivos, a CEO destaca a importância de reconhecer as empresas que abraçam a causa de gênero verdadeiramente. “Muitas companhias dizem que querem mais colaboradoras, mas não querem que elas sejam mães, esposas ou tenham esses papéis considerados femininos”, aponta. 

Minoria absoluta, hoje, no Brasil, apenas 37,4% dos cargos gerenciais em empresas são ocupados por mulheres. O dado foi obtido na pesquisa “Indicadores Sociais das Mulheres no Brasil”, realizada pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). Segundo o mesmo levantamento, as profissionais do gênero feminino ainda recebem uma remuneração até 38,1% menor para atuarem na mesma função do que os colegas homens. 

No entanto, ao que tudo indica, esse cenário vem sendo alterado – mesmo que a passos lentos. De acordo com a última pesquisa de gênero promovida pela unidade de negócios da recrutadora PageExecutive, a contratação de mulheres para cargos de liderança chegou a crescer 20% em 2020. Em vista disso, a Elas Que Lucrem convidou Dani Verdugo para falar sobre as perspectivas do mercado de alto escalão para as brasileiras. Veja, a seguir, o que ela tem a dizer sobre o tema::

Elas Que Lucrem: Atualmente, como você avalia o mercado executivo C-level para as mulheres brasileiras?

Dani Verdugo: Está evoluindo. Mas é um fato que poderíamos estar muito à frente em relação à presença no C-level e nos cargos de lideranças. Se eu for olhar os dados do meu negócio, de 2017 para cá tem aumentado muito a participação de mulheres e não só nas diretorias, mas também nas presidências e conselhos. Ou seja, finalmente estamos chegando na área estratégica das empresas. No entanto, a remuneração abaixo da masculina ainda é um desafio em muitos casos. Na minha opinião caminhamos para uma boa direção, mas ainda é pouco perto do potencial que temos. 

EQL: Quais áreas corporativas estão em alta para as profissionais do gênero feminino?

DV: Eu diria que hoje todos os setores estão buscando mulheres. Claro, existem aqueles mercados mais abertos, como o de moda, beleza e saúde, que historicamente já ofereciam mais espaço para as profissionais. Mas hoje eu vejo um crescimento bastante linear em indústrias mais masculinas, inclusive para posições de liderança. O mercado entendeu que a mulher faz diferença nos aspectos intelectuais e também culturais. 

EQL: Ao pensar nas questões ligadas à diversidade, como as mulheres podem agregar no desempenho das empresas quando passam a ocupar cargos de maior destaque?

DV: A mulher tende a ser flexível, a ter uma visão mais macro e a ser mais sensível na gestão de pessoas. Por isso, ela é capaz de influenciar mais as equipes, o que resulta em vários ganhos diferentes. Eu também acredito muito na complementaridade, na união de forças entre homens e mulheres, e não na competição. 

Agora, quando pensamos nas empresas lideradas por mulheres, o clima e a gestão acabam sendo muito diferenciados – principalmente devido a essas características fundamentalmente femininas, como a sensibilidade e habilidade de relacionamento. 

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EQL: Com base na sua experiência como recrutadora, quais são as características femininas mais valorizadas hoje no mercado de trabalho?

DV: São justamente essas ligadas à habilidade de relacionamento. Mas é preciso ter cuidado, porque hoje algumas empresas dizem que querem contratar mulheres sempre positivas, duras, pouco sensíveis e fortes – ou seja, elas querem contratar mulheres masculinas. Querem uma mulher, mas só se ela não tiver filhos ou se eles forem crescidos. Isso não é aceitar uma mulher na sua totalidade. Faz parte do ser feminino poder e querer engravidar ou amamentar. 

Algumas companhias já entenderam essa questão e aceitam gestantes no recrutamento, tratando o tema com naturalidade, além de incorporarem esse lado da feminilidade. Quem contrata uma mulher precisa querer aproveitar essa visão de mãe, grávida, esposa ou divorciada que as executivas podem ter. 

EQL: Quais desafios as mulheres enfrentam quando decidem apostar num cargo executivo?

DV: São todos, né? Tanto na empresa, quanto na vida real. É muito difícil conciliar o contexto familiar, o preconceito, a cobrança entre as próprias mulheres e as expectativas do parceiro. Existe muita pressão em relação à maternidade – para mim, é um dos maiores desafios entre tantos outros na nossa sociedade machista. Sei de vários casos em que a questão da fertilidade era tratada de modo velado em entrevistas de emprego, com muito desconforto. Hoje eu tenho 40 anos, não sou mãe e isso é muito em função da minha carreira.

EQL: O que as empresas podem fazer para aumentar e reter a presença de mulheres?

DV: Como empresa, quando eu decido aumentar a minha diversidade, preciso compreender que a mulher tem uma série de características. Além disso, tem a questão da credibilidade. Se aquela profissional percebe um movimento genuíno de aumentar a diversidade, ela irá se engajar rapidamente. Agora, se ela notar que é minoria e que terá que abrir mão da sua feminilidade, ela vai pedir para sair. Imagina que, no primeiro momento, já é falado que ela nunca poderá sair cedo para buscar o filho na escola – isso já é um problema. A empresa não vai reter diversidade de gênero. Quem segura suas colaboradoras são justamente os negócios que aceitam o universo feminino em sua totalidade. 

EQL: Você acredita que algumas áreas encontram mais problemas em relação a essa retenção de talentos?

DV: Isso não está muito ligado ao setor, mas à empresa. Existem negócios de engenharia, por exemplo, que são incríveis, possuem uma boa governança. O que acontece é que as executivas passam a pesquisar a presença de mulheres na equipe de liderança, a investigar a cultura e os valores. Indicadores de pouca diversidade acabam sendo sinais vermelhos, o que dificulta o recrutamento. 

EQL: Durante um processo seletivo onde a maior parte dos outros candidatos é homem, como uma profissional pode se destacar?

DV: Em primeiro lugar, a mulher precisa conseguir eliminar essa informação e considerar os homens como outros candidatos, independentemente de gênero. Depois disso, quando for perguntada sobre questões femininas, como é o caso da maternidade, ela deve se manter muito segura. E, se não perguntaram, ela deve trazer essas questões à tona, porque são as nossas características que nos fazem únicas. É isso: não se deixar intimidar por todos os outros homens e nem se colocar como inferior ou superior.  

EQL: Você acredita que vamos conseguir alcançar a equidade de gênero nas grandes companhias?

DV: Eu acho que sim. Hoje, mais de 50% dos estudantes do ensino superior são mulheres, então, no médio e longo prazos, este será o caminho. Ao mesmo tempo, ele será bem árduo, porque é algo que depende de muitos stakeholders. Mas confesso que só de ver essa pauta de ESG ocupando espaço na estratégica já fico muito feliz. 

De verdade, acredito muito no movimento, não por romantismo, apenas, mas, por causa do que os dados nos mostram e do que os grandes empresários falam. As empresas estão, de fato, tentando se adaptar e reconhecer a importância da diversidade em todos os seus pilares. O que precisamos é colocar muito mais energia e mais foco, levantar mais essa bandeira. Mas, claro, não dá para comparar o que a gente tem hoje com o que acontecia há 15 anos. 

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