“Quanto mais você se abre na internet, mais dá munição para que as pessoas a atinjam”, diz Dora Figueiredo

Com quase 800 mil seguidores no Instagram, a criadora de conteúdo conquistou seu espaço ao tratar temas como relacionamentos e body positive
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Divulgação
Atualmente, Dora conta com 1,9 milhão de inscritos no YouTube e quase 800 mil seguidores no Instagram (Foto: Divulgação)

Quando pequena, as brincadeiras preferidas de Dora Figueiredo envolviam atuação e comunicação. “Meu primeiro podcast foi em fita cassete, entrevistando a minha família”, brinca a influenciadora, que fez curso de teatro até os 18 anos. “Quando o YouTube começou a fazer muito sucesso, em 2011, eu estava terminando o ensino médio. Sempre achei que seria ótima nesse negócio de gravar vídeos, mas sabia que não aguentaria o tranco de trabalhar com a internet e lidar com os constantes julgamentos.” Nessa busca para se enquadrar nos padrões, Dora não investiu na plataforma de vídeos – e também não continuou estudando comunicação. Na realidade, ingressou na área acadêmica e foi cursar nutrição. 

“Eu achava que precisava fazer aquilo. Tinha um desejo muito profundo de me enquadrar”, recorda. Essa peregrinação pelo pertencimento a um modelo preconcebido, no entanto, não durou muito. Tudo começou a desandar quando ela percebeu que aquela carreira não a faria feliz. “Tomei coragem e retomei o sonho de trabalhar com comunicação. Fiz isso como um plano B, sem desistir da nutrição, mas já foi um passo importante para mim.” Em 2016, finalmente ela criou um canal para falar sobre relacionamentos. O primeiro vídeo, “5 Coisas Para Não Fazer No Namoro”, foi gravado com a intenção de parecer uma conversa entre amigas. “Queria falar com outras mulheres.” 

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Aparentemente, as mulheres também queriam falar com Dora, e seu canal logo começou a decolar. Mas, como ela já sabia desde a época do colégio, não é nada fácil trabalhar com internet. Por mais que os vídeos exigissem grande esforço, o retorno financeiro era lento, o que fazia com que o projeto realmente fosse encarado como um plano B. “Foi só em 2019, após três anos de produção de conteúdo, que eu consegui largar outros empregos e me manter apenas focada nisso.” Conseguir criar um espaço de relevância no YouTube e no Instagram foi uma grande conquista. “Encontrar meus seguidores é o que me move”, destaca a influenciadora, que sabe reconhecer que esse apoio é um dos lados mais valiosos do trabalho online. 

As dores do processo, no entanto, são ardidas e duradouras. Em 2019, embora tivesse conquistado estrutura financeira, a vida pessoal de Dora se entranhava cada vez à a exposição na rede. “Na época, eu expus um relacionamento abusivo. Eu tinha acabado de ter uma crise de ansiedade. Gravei, mandei para a minha editora e pedi para ela publicar. Nem conferi antes de ir ao ar. Era um ato de desespero, porque o abuso não passava”, conta. O vídeo, que hoje conta com quase 3 milhões de visualizações no Youtube, foi um desabafo para os seguidores e a forma que a influenciadora encontrou de se libertar de tudo que estava segurando dentro do peito. 

“Meu trabalho era falar de relacionamentos e eu estava vivendo um que era abusivo. Por muito tempo, isso destruiu a minha autoestima em um nível muito profundo. Meu trabalho envolve conversar com as pessoas na internet, mas tinha dias em que eu não conseguia sair da cama. Eu precisava explicar isso para as pessoas. Explicar por que eu não conseguia mais falar sobre relacionamento.” Até hoje, Dora diz que sente dificuldade em abordar alguns assuntos. “Até algum tempo atrás, eu nem comentava sobre esse vídeo nas entrevistas. Se eu falasse, passava três dias chorando depois. É um processo. Hoje em dia, ainda não falo de sexo porque é um gatilho. Era o meu trabalho, mas agora me faz mal. Eu precisava me abrir.” 

Até hoje, os 25 mil comentários desse vídeo são um reflexo do quanto o relacionamento abusivo é – infelizmente – algo comum. Após a postagem, a influenciadora recebeu diversas mensagens de mulheres que haviam passado pela mesma situação ou que perceberam que estavam vivendo algo muito parecido. Criou-se um espaço de apoio e união entre as mulheres, mas isso não foi o bastante para que os julgamentos passassem ao largo.

“Sempre que eu ouço mulheres dizendo que querem expor o relacionamento abusivo delas, assim como eu fiz, eu digo para elas pensarem um milhão de vezes antes de tomarem essa atitude. Depois disso, melhor pensar mais um milhão de vezes de novo”, brinca. “Tem gente que me odeia até hoje por conta desse vídeo. Eu tenho haters fanáticos, que provavelmente possuem grupos apenas para falar mal de mim – sempre em referência ao meu corpo ou ao abuso que eu sofri. É muito pesado. Quanto mais você se abre na internet, mais você dá munição para os outros a atingirem.” 

ENTRE O GLAMOUR E O ÓDIO 

Pode-se dizer que a Dora de 17 anos, estudante, estava muito à frente de seu tempo quando dizia que era preciso saúde mental para atuar na internet. Hoje, em um momento de glamourização completa do trabalho nas redes sociais, ela alerta sobre a dificuldade de trabalhar no meio. “É antinatural saber o que milhões de pessoas acham de você. Não fomos programadas para isso”, diz, entre risadas. “Quem disser que sabe lidar, está mentindo. É um trabalho incrível, pode parecer glamuroso, mas o revés disso tudo é muito grande. As pessoas sabem de traumas profundos da sua vida, e muitas delas vão usar isso contra você. Não dá para romantizar.” 

De certa forma, algumas pessoas acham que têm o direito de comentar o que quiserem sobre a vida dos influenciadores digitais e celebridades de uma maneira geral. Sob o anonimato da internet, parece que as vidas que estão sendo expostas são um espaço público, onde qualquer um pode opinar. “Eu passava por um período de compulsão alimentar gerado por aquele relacionamento abusivo. Quando comecei a engordar, depois de ser controlada por tanto tempo, as pessoas disseram que eu estava grávida. Pior do que isso: algumas diziam que eu estava engordando para ganhar curtidas”, lembra. “Eu não queria falar sobre o meu corpo, mas precisei porque não me deixavam em paz. Não foi uma estratégia para ingressar no mercado de body positive.” 

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Após começar a tratar do tema, Dora percebeu que muitas mulheres se identificavam. Hoje,  quando se sente confortável, faz questão de abordar o assunto. “Enquanto não for um gatilho, eu posso falar sobre isso, mas sempre tomo muito cuidado. Quando estou mal com a minha autoestima, não posto foto de biquíni dizendo que eu estou me sentindo maravilhosa. Isso é uma positividade tóxica. É errado. Quando eu estou mal, simplesmente não falo sobre o assunto.” Essa atenção que a influenciadora dá ao impacto de seus conteúdos é um dos motivos da confiança que ela criou com seus seguidores nos últimos anos.

“Não é uma carreira fácil. É ingrata. Muitas vezes, você é persuadido por números que não definem o seu trabalho. São apenas um reflexo ególatra e não determinantes para o sucesso de ninguém”, ressalta. “Depois de quase seis anos trabalhando com isso, eu sei que o que determina a relevância de alguém é o conteúdo. Quando eu vejo que mulheres saíram de relacionamentos abusivos por conta do meu vídeo, enxergo que meu trabalho deu certo e me vejo como relevante na sociedade. Ter 20 milhões de seguidores no TikTok é incrível, mas não é só isso. Às vezes, um criador de conteúdo com 70 mil seguidores no Instagram tem mais impacto.” 

Atualmente, com 1,9 milhão de inscritos no YouTube e quase 800 mil seguidores no Instagram, Dora diz que seu foco não é entrar na lista dos influenciadores mais seguidos do Brasil. “Quando eu estava no hype, com meu nome toda semana nos trending topics, eu estava triste. Agora, estou feliz com a minha carreira. Quero estudar atuação e fazer as coisas que eu amo. A fama é o revés do sucesso”, conclui.

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