Por que sentimos culpa em momentos de descanso

Psicanalista diz que “elogio ao excesso de trabalho deixa as pessoas aprisionadas na ideia de que estão sempre fazendo menos”
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Por que sentimos culpa em momentos de descanso
No caso das mulheres e mães, além do excesso de trabalho, há ainda outros discursos socialmente construídos que as pressionam a estarem em constante atividade.

Os momentos de descanso e lazer estão presentes em todas as culturas. Nas religiões, por exemplo, os cristãos possuem o domingo como dia de descanso. A cultura judaica realiza o shabat, em que da sexta-feira à noite ao pôr do sol de sábado não se pode trabalhar. Já os muçulmanos estipulam a sexta-feira como dia de descanso. 

Mesmo que não seja com intuitos religiosos, os momentos de descanso também estão colocados nas jurisdições trabalhistas, ao firmarem horários de trabalho, direitos a períodos de folga, férias e assim por diante. Além disso, há diversos estudos que demonstram que o excesso de trabalho e responsabilidades são prejudiciais à saúde mental, enquanto que o tempo de inatividade é necessário para restaurar a atenção e a motivação, sendo essencial para estimular a criatividade e produtividade. 

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Porém, a sensação de culpa e pensamentos de estar “perdendo tempo” durante o descanso existe e é comum, segundo a psicanalista Ingrid Figueiredo, professora de psicologia do centro universitário Faculdades Metropolitanas Unidas (FMU) e da Universidade Ibirapuera. “Esse sentimento é coletivo e afeta a todos, principalmente as mulheres e mães”. 

Mas por que sentimos culpa no descanso? 

Para Ingrid, essa sensação está atrelada a uma contradição imposta pelo próprio discurso do sistema capitalista, que valoriza o consumo e a alta competitividade. 

“Para consumir, é preciso ter lucro, mas de onde vem esse lucro? No caso das pessoas comuns vem por meio do trabalho, então internalizamos que precisamos trabalhar mais. Ao mesmo tempo, o indivíduo tem o direito por lei de descansar, mas retira esse direito de si mesmo pela culpa quando internaliza que para chegar ao topo não pode parar de trabalhar. Será que precisa mesmo?  Essa questão precisa ser colocada”, afirma a psicóloga. 

Segundo a professora, o trabalho dá sentido à vida, mas não precisa ser uma tortura. “As pessoas se reconhecem por suas atividades e isso é importante, mas esse elogio ao excesso de trabalho também as deixam aprisionadas na ideia de que estão sempre fazendo menos, o que fomenta mais a competição dentro desse discurso”.

A pandemia de Covid-19 intensificou a questão, pois teve um grande impacto na economia. A psicanalista explica que com as demissões, a disputa por postos de trabalho se acirrou e a necessidade de criar novas formas de arrecadar dinheiro se tornou constante, aumentando a sensação de trabalhar incessantemente para virar o profissional do topo. 

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“O próprio home office virou uma prisão dentro do trabalho. É mais ‘office’ do que o ‘home’, argumenta a professora. “Isso porque a casa vira um grande local de trabalho sem intervalos. Fazer seus horários pode ser bom, mas pode ser ruim se o indivíduo internaliza o excesso dentro de casa, porque cria diversos estresses como insônia, compulsão, consumismo, pânico, depressão e tantos outros sintomas que vêm desse estresse de eterna competição. O trabalho vira mais fonte de mal estar do que prazer e identificação”. 

No caso das mulheres e mães, além do excesso de trabalho, há ainda outros discursos socialmente construídos que as pressionam a estarem em constante atividade. “O discurso patriarcal impõe outras expectativas para as mulheres cumprirem. Acaba que a mesma mulher se torna um ‘cabo de guerra’ entre a profissional, a mãe, a esposa, a filha e tudo que socialmente se espera dela”, comenta Ingrid que além de psicóloga, professora e pesquisadora, também é mãe. 

Para ela, é importante que o indivíduo consiga elaborar estratégias de como barrar o excesso de trabalho. “Antes era previsto o horário de almoço, uma pausa para o cafezinho, o próprio transporte de ir e voltar do local de trabalho já era uma pausa de reflexão ou abstração do trabalho. Agora é necessário manejar esse tempo para se dar a possibilidade de pensar em outras coisas além das tarefas”. 

A reflexão e questionamento sobre a nossa relação com o trabalho e nossos limites dentro do discurso de alta produção e competitividade são necessários para facilitar a forma como lidamos com todas essas questões, segundo a psicóloga. 

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