Foi durante uma viagem quase secreta a Washington D.C, capital dos Estados Unidos, que Andreza Cooper, 37 anos, teve o encontro mais memorável da sua carreira. Avisada por uma de suas clientes que deveria acompanhar uma visita à Casa Branca, ela se deparou com um dos casais mais respeitados do país: Barack e Michelle Obama. Na ocasião, chegou a tirar uma foto com o então presidente norte-americano, além de receber um elogio da primeira-dama: “Ela foi muito humilde, apresentou-se e disse que a minha profissão era muito importante”, lembra.
O episódio poderia ter acontecido com uma diplomata ou política, mas, na verdade, ele faz parte das memórias da brasileira como newborn care specialist – NCS, ou especialista de cuidado com recém-nascidos, da sigla em inglês. A profissão, que não possui um nome correspondente no Brasil, equivale a uma mistura entre o trabalho de babá e o de doula – embora a maioria das pessoas pense que esta última só participa da hora do parto, na realidade sua atuação vai muito além, estendendo-se para momentos antes, durante e depois do nascimento do bebê. Ou seja: Andreza se dedica, simultaneamente, aos cuidados com o recém-chegado e à rotina da família.
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No caso da brasileira, esse dia a dia ganha um “tempero” a mais: nos últimos anos, ela vem sendo requisitada por celebridades como Khloe Kardashian, Jordana Brewster e Kevin Hart – entre outros nomes que não podem ser mencionados devido aos contratos de sigilo. “Novos clientes geralmente chegam por indicação. Eles confiam em mim porque nunca vazei nenhuma informação de residências anteriores”, conta. Entre anônimas e famosas de Hollywood, Andreza estima que já tenha ajudado 36 bebês e suas famílias. “Eu amo o que faço e não me arrependo de nada que tenha feito para chegar até aqui”, afirma.
Babá por acaso
Antes de frequentar os lares dos famosos, no entanto, a especialista precisou percorrer um longo caminho entre deixar o Brasil e mudar de carreira.
Natural de Natal, no Rio Grande do Norte, Andreza decidiu que sairia do país aos 14 anos. “Sempre quis ir embora por causa violência. Fui assaltada três vezes e, em uma delas, colocaram uma arma na minha cabeça”, diz. Assim, na primeira oportunidade, ela se mudou para Portugal, país onde cursou moda e viveu até os 25 anos.
A próxima parada, relembra ela, deveria ser Paris ou alguma outra cidade da Europa. “Naquele momento, era o que eu sonhava.” Mas o destino acabou desviado depois que a mãe de Andreza, que na época trabalhava como enfermeira em Los Angeles, pediu que as filhas fossem morar com ela nos Estados Unidos, a princípio só por alguns meses. “Como ela era cidadã norte-americana, isso nos dava o direito de tirar a mesma documentação e obter o green card [cartão de residência permanente]. Nem eu, nem minha irmã, queríamos ir, mas ela nos convenceu de que seria melhor aproveitar esse benefício”, explica.
Foi assim que Andreza desembarcou no país em 2010. Sem conseguir ficar parada, como ela mesma brinca, logo começou a procurar alguns pequenos trabalhos para se ocupar, daqueles que não exigiam cidadania e documentos. O primeiro deles foi como babysitter – ou babá – em uma família com três crianças. “Eu adorei logo de cara. Era algo que só acontecia esporadicamente, quando o casal saia sozinho, então era muito tranquilo”, diz. A partir daí, de boca em boca, ela passou a se dedicar cada vez mais aos cuidados infantis. “Acredito que tenha sido mais fácil para mim por ter a indicação da minha mãe e também por já falar inglês”, diz.
Poucos meses depois de se tornar babysitter, ela foi chamada para trabalhar em uma casa um pouco diferente daquelas às quais estava acostumada. Em vez de crianças, ela cuidaria de um recém-nascida com menos de duas semanas de vida. “A mãe estava com depressão pós-parto e não conseguia fazer nada. Por outro lado, eu não tinha experiência nenhuma e aquilo era uma responsabilidade muito grande. Eu cheguei a avisar a mulher que não iria, e a única coisa que ela fez foi me dar um livro para ler, o ‘Baby Wise’ [‘Nana, Nenê ‑ Como Cuidar de Seu Bebê Para Que Ele Durma’, em português]. Ele acabou me ajudando muito e, até hoje, eu aplico o que li com meus clientes”, lembra. E, apesar das dificuldades envolvidas na criação de um ser tão pequeno, a convivência acabou despertando Andreza para o que seria uma nova oportunidade profissional. “Vi que aquilo era uma opção real de trabalho, que eu poderia evoluir. Acredito que todos podem se sentir realizados em mais de uma profissão, então não fiquei insegura de largar de vez a moda”, diz.
Naquele momento, a documentação de residência norte-americana já estava atrasada. E, enquanto procurava cursos e capacitações para se dedicar ao cuidado de recém-nascidos, a brasileira foi ficando. Hoje, já são 12 anos por lá, sem previsão de volta. “Muita gente me dizia que era besteira deixar o Brasil para lavar bumbum de neném fora, mas eu acredito que cada um sabe o que precisa ser feito. Minha condição de vida no meu país era muito melhor do que a que eu tinha quando cheguei aqui, mas é uma questão de escolha.”
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24 horas de trabalho e contratos de sigilo
Chamada de babá, doula e enfermeira por quem não conhece a especialidade NCS, Andreza explica que seu trabalho consiste em apoiar a família durante os primeiros meses após a chegada do bebê, cuidando de necessidades como a preparação do quarto, a amamentação e a rotina de sono da criança. Por isso, quase sempre ela é contratada ainda durante a época da gravidez da cliente, quando chega a realizar algumas visitas à casa da família.
“Eu dou início ao meu expediente no dia em que a mãe retorna do hospital. A partir daí, são de quatro a seis meses em que trabalho 24 horas por dia. Quando comecei, não tinha folga, eram sete dias da semana dedicados a isso. Hoje já descanso, em média, três dias por semana”, explica.
Com todas as horas do dia ocupadas pelo trabalho, a brasileira precisa se mudar para as casas das famílias durante esses períodos de atendimento. Por causa disso, costuma assinar contratos de sigilo, que garantem que ela não contará nada do que viu ou ouviu nesses lares. “Realmente eu vejo tudo – de brigas de casal até o que eles falam sobre outras pessoas. Por isso, essa confidencialidade vale desde o início”, relata. Andreza conta que já foi até proibida de usar o celular durante o expediente para evitar o vazamento de fotos. “Já me pediram até para não chamar uma das crianças pelo nome verdadeiro e usar um apelido fictício.”
A confidencialidade é tanta que, em casos de viagem, a NCS só costuma saber qual é o destino na hora que chega ao local. Mesmo assim, não costuma ser informada da data de volta. E para quem pensa que o turismo é um benefício extra do trabalho, está enganado: ela conta que passa a maior parte do tempo em um quarto escuro do hotel, acompanhada apenas do bebê. “Teve uma vez que me marcou muito. Era Natal e viajei com a família para Nova York. Chegando lá, a minha cliente perguntou o que eu queria ganhar de presente. Eu estava trabalhando 24 horas por dia e disse que queria uma pequena folga para visitar a árvore do Rockefeller Center e voltar. Ela ouviu, mas não me liberou”, relembra.
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Momentos inesquecíveis
Entre um segredo e outro, Andreza assume que gosta de trabalhar perto de figuras famosas – não pela fama em si, explica, mas sim pela sensação de reconhecimento. “Faz muito bem para o ego saber que estão gostando do que eu faço e me indicando para outras pessoas incríveis”, diz.
Somado a isso, a brasileira acabou tendo alguns momentos inesquecíveis no trabalho. A visita à Casa Branca é um dos exemplos, já que ela nem sabia que poderia acompanhar a família naquele dia. “Quando me avisaram que eu ia, fiz que ‘tudo bem’ com a cabeça, mas por dentro estava muito eufórica.” A surpresa só aumentou quando ela entrou na sala oval e foi apresentada ao presidente e à primeira-dama.
Além deste episódio, a clientela vip rendeu encontros com algumas das figuras mais famosas de Hollywood, como o ator The Rock, a quem a se refere como “um fofo”, e a atriz Shonda Rhimes, com quem Andreza chegou a dividir um jatinho para chegar à uma festa. Outros contatos inusitados foram com os cantores Justin Bieber, Fergie e Sia. “O namorado da Fergie chegou a ir em um aniversário meu, a convite da minha mãe, mas normalmente não podemos tietar ninguém”, conta.
Apesar da vida perto do glamour, Andreza diz que, em breve, pretende se aposentar da profissão de NCS para se tornar apenas consultora do assunto. “Sou muito realizada com o que faço. É incrível ver o resultado do meu trabalho refletido em uma criança e em uma família feliz”, conclui.
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