Dia Internacional dos Direitos Humanos: 7 brasileiras que dedicaram suas vidas ao ativismo

Da defesa do meio ambiente às causas ligadas à educação e saúde, elas sempre defenderam os mais vulneráveis
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Zilda Arns foi uma importante médica pediatra e sanitarista (Foto: Divulgação)

Há 73 anos, a humanidade ainda se reorganizava depois do fim da Segunda Guerra Mundial, conflito que tirou a vida de pelo menos 85 milhões de pessoas no mundo todo. Diante do temor provocado pelo genocídio, a Assembleia Geral das Nações Unidas (AGNU) instituiu a Declaração Universal dos Direitos Humanos, a primeira ocasião em que os países chegaram a um acordo sobre uma declaração abrangente de direitos humanos. 

A Declaração Universal inclui direitos civis e políticos, como à vida e à liberdade de expressão. De forma ampla, ela também inclui os direitos econômicos, sociais e culturais, como o acesso à saúde e à educação. Um marco para a humanidade, a declaração foi colocada em prática no dia 10 de dezembro de 1948 – data que ficou conhecida como Dia Internacional dos Direitos Humanos. 

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Pensando na data, a Elas Que Lucrem listou sete mulheres que se destacaram pelo ativismo de impacto – seja ele relacionado ao direito das mulheres ou dos trabalhadores rurais da Amazônia. Conheça, na lista abaixo, as brasileiras por trás da luta em favor dos direitos humanos: 

Bertha Lutz

Bertha Lutz lutou pelo voto feminino (Foto: Divulgação)

Zoóloga de formação, ativista de coração. Bertha Lutz foi uma face importante na luta pelos direitos das mulheres, principalmente pelo voto feminino. Nascida no dia 2 de agosto de 1824, em São Paulo, Bertha Maria Júlia Lutz era filha de mãe inglesa, a enfermeira Amy Fowler, e pai brasileiro, o cientista Adolfo Lutz. Ela foi criada na Europa, formou-se em ciências naturais na universidade parisiense de Sobornne e posteriormente em direito, na Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), em 1933. 

Bertha voltou ao país onde nasceu em 1918 e aqui conseguiu um cargo de bióloga no Museu Nacional. Naquela época, ela já fazia história: ao ocupar a vaga, foi a segunda mulher a fazer parte do serviço público no Brasil. 

Em 1919, criou a Liga para a Emancipação Intelectual da Mulher e, em 1922, representou o Brasil na Assembleia-Geral da Liga das Mulheres Eleitoras, realizada nos Estados Unidos. Ao retornar ao Brasil, Bertha fundou a Federação Brasileira para o Progresso Feminino, substituindo a Liga de 1919. Começava, então, a luta pelo direito de voto para as mulheres. Sob sua presidência, que perdurou por 20 anos, entre 1922 e 1942, a federação reuniu diversas associações estaduais e nacionais femininas. 

Ao longo dos anos, foi responsável pela fundação de diversas uniões feministas que lutavam pela emancipação da mulher. Nesse sentido, em 1934, candidatou-se na legenda do Partido Autonomista do Distrito Federal à Câmara dos Deputados, representando a Liga Eleitoral Independente, que havia fundado dois anos antes. No exercício do mandato parlamentar, Bertha Lutz lutou pelos direitos femininos, propondo mudanças na legislação referente ao trabalho da mulher e dos menores de idade, além de igualdade salarial, isenção do serviço militar feminino e licença de três meses à gestante sem prejuízo de vencimentos. 

Já para o lado da ciência, elaborou projetos para o combate à lepra e à malária no Rio de Janeiro. Bertha permaneceu no cargo até 1937, quando foi instituído o Estado Novo no Brasil e todos os órgãos legislativos do país foram dissolvidos.

Bertha atuou em várias frentes ao longo da vida, defendendo as mulheres e também trabalhando com sua primeira formação em ciências naturais. Ela faleceu aos 82 anos no dia 16 de setembro de 1976.

Dorina Nowill 

Dorina lutou pela inclusão de cegos na educação (Foto: Divulgação)

Ativista e educadora, Dorina Nowill (1919 – 2010) ficou conhecida por seu trabalho com deficientes visuais em sala de aula, ganhando o apelido de Dama da Inclusão. Cega desde os 17 anos, quando sofreu uma infecção ocular, a paulistana foi a primeira estudante a frequentar a escola regular sem conseguir enxergar. 

Mesmo com a falta de materiais adaptados e de professores capacitados a ajudá-la, Dorina conseguiu se formar e logo  ingressou no magistério na Escola Caetano de Campos, onde deu início à carreira na área de educação. Logo depois de concluir o curso, foi convidada pelo governo norte-americano a frequentar uma especialização na área de deficiência visual na Universidade de Columbia. 

Quando voltou ao Brasil, participou da fundação da primeira editora adaptada para o sistema de escrita tátil do país, a Imprensa Braille. Por causa dessa ação, recebeu das instituições norte-americanas Kellogg Foundation e American Foundation for Overseas Blind uma imprensa braille completa, com a qual criou o seu projeto mais famoso, a Fundação para o Livro do Cego no Brasil, atual Fundação Dorina Nowill. 

Sua atuação na educação também se expandiu para o departamento estadual, onde fez parte da regularização do ensino para deficientes visuais. Em 1947, ajudou a criar o Departamento de Educação Especial para Cegos por meio da Secretaria de Educação de São Paulo.

Atualmente, a Fundação Dorina Nowill oferece suporte e serviços variados, todos gratuitos, para crianças, jovens e adultos com algum tipo de deficiência visual. Além do acesso à educação e cultura, a instituição auxilia os beneficiários a ingressarem no mercado de trabalho e, assim, ganhar autonomia. 

Dorothy Stang 

Dorothy lutou em defesa da Amazônia (Foto: Divulgação)

Chamada de “anjo da Amazônia”, a irmã Dorothy Stang nasceu em Ohio, nos Estados Unidos, mas foi naturalizada brasileira por conta de sua luta de décadas em favor do desenvolvimento sustentável da Amazônia. Seu ativismo começou ainda em 1950, quando ingressou na vida religiosa e começou a fazer parte da Congregação das Irmãs de Notre Dame de Namur, que reúne mais de 2.000 mil mulheres que realizam trabalho pastoral nos cinco continentes. Em 1966, iniciou seu ministério no Brasil na cidade de Coroatá, no Estado do Maranhão.

A partir dos anos 1970, Irmã Dorothy esteve presente na Amazônia junto aos trabalhadores rurais da Região do Xingu. Sua atividade pastoral e missionária buscava a geração de emprego e renda para trabalhadores rurais com projetos de reflorestamento em áreas degradadas. Para melhorar o desenvolvimento sustentável da região, ela chegou a fundar escolas e promover a alfabetização como tentativa de mudar o futuro da população local. Além disso, também lutava para minimizar os conflitos fundiários do local, um posicionamento que lheh custou a própria vida. 

Em 2005, aos 73 anos, Dorothy foi morta com seis tiros na cabeça e cinco ao redor do corpo em Anapu, no Pará. Vista como alguém que desafiava os interesses de fazendeiros, madeireiros e grileiros, a ativista teve sua voz calada por um atentado violento. O assassinato teve intensa repercussão nacional e internacional, e seu enterro reuniu milhares de admiradores da causa. Antes do ocorrido, ela já havia recebido diversas ameaças de morte, mas não se deixava intimidar. 

“Não vou fugir e nem abandonar a luta desses agricultores que estão desprotegidos no meio da floresta”, declarou um pouco antes de sua morte. “Eles têm o sagrado direito a uma vida melhor numa terra onde possam viver e produzir com dignidade sem devastar.” Em 2004, recebeu uma premiação da Ordem dos Advogados do Brasil por sua luta em defesa dos direitos humanos.

Indianara Siqueira

Indianara é fundadora da Casa Nem (Foto: Divulgação/TV Brasil)

A ativista Indianara Siqueira, 50 anos, é fundadora da Casa Nem, que abriga a população LGBTQIAP+ em situação de rua e vulnerabilidade no Rio de Janeiro. Ela criou o projeto em 2016 com o objetivo inicial de fornecer um local para as aulas de um pré-vestibular preparatório para o Enem voltado para transexuais, transgêneros e travestis. Indianara sempre sonhou com mais diversidade nas universidades públicas brasileiras. 

Porém, logo no início das aulas, percebeu que muitas alunas não tinham onde morar ou estavam em abrigos com condições precárias, além de sofrerem violência das próprias famílias. Então, ela decidiu que era o momento de expandir as ações e proporcionar acolhimento a esse público. 

Mas, na prática, colocar o plano em prática não foi fácil. E ainda não é. Como não tinha dinheiro suficiente para alugar um imóvel, Indianara buscava ocupar locais abandonados e sem uso social. Ela conseguiu um espaço de um prédio na Lapa, no Rio de Janeiro, e as aulas do pré-vestibular foram realizadas por lá. Na ocasião, das 20 pessoas que fizeram o curso, 12 conseguiram entrar em uma instituição de ensino. 

Mas em dezembro de 2018, o imóvel precisou ser desocupado. O grupo se deslocou para um abrigo em Vila Isabel, também no Rio. Em 2019, mais uma vez, o grupo foi obrigado a abandonar o espaço depois que os donos entraram com uma ação de reintegração de posse. 

Após colecionar uma série de expulsões, muitas delas com relatos de truculência policial, a Casa Nem conseguiu um acordo com o governo do Rio de Janeiro para ter uma moradia fixa. Em 2020, a gestão estadual cedeu um imóvel no bairro do Flamengo. Atualmente, o projeto garante a moradia de 30 pessoas em vulnerabilidade social. 

Além de um lugar para morar, a Casa Nem também proporciona cursos, debates, oficinas, festas e ações para empoderar o público LGBTQIAP+.

A luta pelo acolhimento dessas pessoas foi a inspiração para o documentário “Indianara”, que conta parte da vida da ativista e foi exibido no Festival de Cannes, em 2019. O filme teve forte repercussão na Europa, especialmente na França, onde foi exibido em 70 salas de cinema.

Apesar do esforço feito por Indianara, o Brasil ainda está no topo do ranking de países que mais matam pessoas trans no mundo. Em 2020, foram 175 travestis e mulheres transexuais assassinadas, segundo a Associação Nacional de Travestis e Transexuais (Antra). A alta é de 41% em relação ao ano anterior, quando foram registrados 124 homicídios. 

E nem ela escapou da violência. Em agosto deste ano, a ativista transexual foi agredida com socos e coronhadas em um bar na Lapa após defender uma amiga, vítima de assédio sexual e ofensas por ser uma mulher trans. Ela sofreu fraturas e cortes por todo o corpo.

Por sua atuação na defesa dos direitos humanos, Indianara ganhou o Prêmio à Diversidade, Direito e Respeito à Cidadania concedido pela Assembleia Legislativa do Rio de Janeiro em 2019. Ela chegou a concorrer ao cargo de vereadora nas eleições municipais do Rio de Janeiro pelo PSOL, em 2016, e pelo Partido dos Trabalhadores, em 2020.

A ONG carioca Casa Nem vive de doações, em dinheiro ou em materiais. As interessadas em ajudar podem ligar no (21) 98880-0322 ou por meio da vaquinha coletiva neste link.

Margarida Maria Alves

Margarida era sindicalista e atuava em defesa dos trabalhadores rurais (Foto: Divulgação)

Assassinada aos 50 anos por motivações políticas, a sindicalista paraibana Margarida Maria Alves lutou pelos direitos das trabalhadoras rurais durante as décadas de 1970 e 1980. Margarida foi presidente do Sindicato dos Trabalhadores Rurais de Alagoa Grande e fundou o Movimento Mulheres do Brejo, que buscava unir as mulheres camponesas à luta do campo. 

A paraibana foi a primeira mulher a liderar um sindicato engajado com as causas dos camponeses e incomodava fazendeiros por conscientizar os trabalhadores da categoria sobre a exploração sofrida no campo, além de incentivar a luta pela reforma agrária. Margarida reivindicava direitos já contemplados pelo setor industrial, como jornada diária de trabalho de oito horas e carteira assinada. 

Com o avanço do movimento, a paraibana começou a receber ameaças de morte dos latifundiários da região. Apesar disso, ela afirmou que era “melhor morrer na luta do que morrer de fome” em seu discurso na comemoração de 1º de maio de 1983. Em 12 de agosto do mesmo ano, Margarida foi vítima de um disparo de espingarda no rosto e morreu na frente do marido e do único filho. 

Após 17 anos da morte da sindicalista, mulheres do Brasil todo e de diferentes movimentos trabalhistas se juntaram pela primeira vez para formar a Marcha das Margaridas, uma homenagem à líder que fez história na luta pelo fim dos abusos no trabalho rural. Desde 2000, a cada quatro anos, as militantes se reúnem em Brasília (DF) nos dias 13 e 14 de agosto para a mobilização, que é a maior do tipo na América Latina.

Nísia Floresta 

Nísia facilitou o acesso das mulheres à educação (Foto: Divulgação)

No dia 12 de outubro de 1810, Dionísia Gonçalves Pinto, filha do português Dionísio Gonçalves Pinto e da brasileira Antônia Clara Freire, nasceu. Natural do município de Papari – cidade que teve o seu nome mudado para Nísia Floresta -, no Rio Grande do Norte, Dionísia nunca almejou a vida tradicional da época. Aos 13 anos, foi forçada a se casar com Manuel Alexandre Seabra de Melo, proprietário de terras, mas a união durou pouco. Após alguns meses, fez um de seus primeiros atos de independência feminina e rompeu a união, voltando para a casa dos pais mesmo diante dos olhos inquisidores da sociedade. 

Após alguns anos, casou-se novamente com Manuel Augusto de Faria Rocha, acadêmico da Faculdade de Direito de Olinda, e foi acusada de adultério pelo marido de quem havia se separado. Menos de dez anos depois, publicou o seu primeiro livro, “Direito das Mulheres e Injustiça dos Homens”, assinado sob o pseudônimo de Nísia Floresta Brasileira Augusta. 

O pseudônimo foi escolhido por conta do nome da fazenda onde nasceu, no Rio Grande do Norte: Floresta. Já o “Nísia” é uma abreviação do seu nome completo. Suas obras fizeram sucesso e fizeram dela a primeira representante de educação feminista do país. Suas escritas foram muito além de simples publicações editoriais. Ao falar sobre direito feminino, a educadora, escritora e poetisa se tornou a primeira mulher a publicar textos em jornais numa época em que a imprensa nacional ainda engatinhava. 

Nísia também dirigiu um colégio para meninas na cidade do Rio de Janeiro e escreveu diversas obras em defesa dos direitos dos indígenas e dos escravos, envolvendo-se plenamente com as questões culturais de seu tempo. Sua contribuição foi tão grande que sua cidade natal – antiga Papari – passou a se chamar Nísia Floresta. 

Zilda Arns 

Zilda já foi indicada ao Nobel da Paz (Foto: Divulgação)

Zilda Arns nasceu no dia 25 de agosto de 1934, em Forquilhinha, Santa Catarina. Filha de Gabriel Arns e Helena Steinar Arns, descendentes de alemães, e irmã de Dom Paulo Evaristo Arns, arcebispo emérito de São Paulo, ela foi uma importante médica pediatra e sanitarista, que dedicou boa parte de sua vida para defender crianças, gestantes e idosos. Ela sonhava em construir uma sociedade mais justa, fraterna, com mais atenção às famílias e menos doenças.

Apesar da resistência paterna, Zilda estudou medicina na Universidade Federal do Paraná e se especializou em pediatria e saúde pública. Ela começou sua vida profissional no Hospital Pediátrico em Curitiba.

Aos 21 anos, Zilda  se casou com o marceneiro Aloysio Neumann, com quem teve seis filhos. Em 1983, fundou a Pastoral da Criança, um programa de ação social da Conferência Nacional dos Bispos do Brasil. 

Em seu trabalho, a médica sempre aliou ciência e cultura popular. Ela empoderou mulheres pobres e líderes comunitárias, levando conhecimento e orientações às gestantes e às famílias. Por seu trabalho social, em 2006, foi indicada ao Prêmio Nobel da Paz.

A médica faleceu no dia 12 de janeiro de 2010 durante o terremoto que devastou o Haiti. O prédio de três andares onde estava desabou e Zilda foi atingida na cabeça, junto com outros religiosos. Horas antes, ela tinha discursado sobre como salvar vidas com medidas simples, educativas e preventivas.

O corpo de Zilda foi levado à Curitiba e aplaudido por uma multidão que se reuniu para se despedir da missionária.

Em 2017, em sua homenagem, foi lançado o Prêmio Zilda Arns pela Defesa e Promoção dos Direitos da Pessoa Idosa, que homenageia pessoas e instituições que se destacam nessa esfera.

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