Saúde social: você sabe o que é isso e quais os impactos?

Apesar de ainda não ser um termo tão conhecido, a saúde social vem ganhando importância, principalmente após a pandemia.
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A saúde social é um fundamento que está ligado ao desempenho dos relacionamentos em diversos âmbitos de uma sociedade como o familiar, profissional e com amigos.

Basicamente, nos diz sobre como anda a qualidade das interações e o quanto isso impacta no aspecto individual.

Trata-se de um conceito de suma importância, o qual a Organização Mundial de Saúde (OMS) considera como um dos pilares da “saúde” – esta que é definida pela entidade como “um estado de completo bem-estar físico, mental e social e não somente ausência de afecções e enfermidades”. 

A verdade é que a saúde social vem ganhando novos contornos. Um deles foi apresentado com a Covid-19 e a necessidade de isolamento social, que agregou desafios que ainda não foram completamente superados.

Uma das vozes de destaque mundial sobre o tema é o Dr. Vivek H. Murthy, médico e co-fundador de diversas organizações e iniciativas humanitárias, que atualmente ocupa o cargo de autoridade máxima no setor de saúde dos EUA.

Murthy vem ganhando proeminência global após a publicação do livro “O Poder Curativo das Relações Humanas: A importância dos relacionamentos em um mundo cada vez mais solitário”, em 2022.

Mas, afinal o que é a saúde social? Para entender, ouvimos uma terapeuta integrativa que apontou como estamos caminhando nos dias de hoje.

Saúde social: como estamos lidando com isso?

Para compreender efetivamente os contornos atuais da saúde social, é necessário observar fatores globais que estão contribuindo de forma positiva ou negativa. 

E nesse sentido, um dos acontecimentos recentes de maior impacto foi a pandemia da Covid-19, que desenhou um novo comportamento em todas as esferas de relacionamento da sociedade, conforme lembra a Terapeuta Integrativa e Consteladora, Solange Roccon José.

“A pandemia foi um fator preponderante na sensação de solidão, devido à grande quebra de rotina no dia a dia dos indivíduos e a sensação de medo que foi gerado. Mas o celular e a internet já vinham causando este aumento há, pelo menos, uma década, devido ao fato de se ter cada vez menos o contato olho no olho e o excesso de informações desencontradas”, aponta a especialista.

Ela relembra que durante a pandemia, as pessoas foram obrigadas a se isolarem em suas casas, muitas não puderam trabalhar e dependendo do grau de risco, tiveram que se afastar até de seus familiares. E tais comportamentos se mantêm, em alguma medida, até hoje.

“Quando o convívio foi retornando, o medo do contágio ainda era muito grande, por isso, muitos daqueles que tinham o hábito de abraçar e beijar seus parentes e conhecidos, abandonaram a prática ou passaram a ter uma maior seleção”, observa.

Conforme a terapeuta, outro grande impacto do isolamento social durante a pandemia e com o qual ainda estamos lidando está nas relações de trabalho, a partir da adesão ao home-office, seja por determinação das empresas ou por opção individual. 

“Muitos permaneceram com este hábito, não voltaram ao trabalho presencial, onde mantinham um contato físico e social com as pessoas. O afastamento dos colegas de trabalho que deveria ser passageiro passou a ser o normal, mantendo as pessoas num certo isolamento. Só que agora não mais obrigatório, mas com um grau de consentimento”, adverte.

Isolamento e solidão: quais as diferenças?

No entanto, é preciso entender que isolamento é diferente de solidão e nem sempre caminham juntos, conforme explica a especialista. 

“O isolamento implica no fato do indivíduo não ter contato físico com outras pessoas. Ele pode ocorrer de forma parcial ou total e em diversas situações e por diversos motivos”, aponta. 

Já a solidão, “é um sentimento ligado à sensação de insatisfação, tristeza, de estar sozinho sem poder contar com ninguém, de estar excluído de tudo e de todos. O indivíduo não consegue criar vínculo com as pessoas e tem a sensação que ninguém o compreende e se sente desamparado”. 

A profissional destaca que a solidão pode ocorrer mesmo quando o indivíduo está cercado de outras pessoas, podendo ser medida em uma escala que pode variar entre níveis leves a intensos, dependendo do tempo de duração e intensidade.

“Pode-se dizer que é leve quando o indivíduo tem pensamentos negativos por um curto espaço de tempo, logo se recuperando. No moderado, o indivíduo já começa a ter um certo grau de sofrimento associado aos pensamentos negativos e o tempo de duração é um pouco maior. Já na de grau intenso, os pensamentos negativos começam a trazer um sofrimento mais profundo associado à sensação de desesperança”, esclarece.

Quando observado o momento pandêmico, por exemplo, a terapeuta ressalta que os indivíduos se mantiveram em isolamento por um tempo, mas nem todos se sentiram solitários. 

“Muitos sustentaram contatos por telefone ou on-line com parentes e/ou com amigos, possibilitando sentirem-se amparados e apoiados. Nesse sentido, um indivíduo pode se encontrar isolado fisicamente de outras pessoas, mas não sentir solidão”, reforça. 

Jovens estão entre os mais solitários

De acordo com a terapeuta, dados indicam que a solidão está aumentando gradativamente em escala global, conforme indicam pesquisas de institutos, como o IPSOS, e Universidade Estadual de San Diego, nos EUA. 

E a faixa etária que mais tem sofrido com tais contornos da sociedade é a dos jovens e adolescentes, que, segundo Solange, sentiram uma ruptura mais intensa durante a pandemia, com atrasos tanto no processo de aprendizagem escolar, quanto social. 

“É como se a vida deles tivesse ficado interrompida por um tempo e depois eles tivessem que retornar sem saber bem onde pararam”, aponta.

Como viver com os outros e restabelecer a saúde social?

Embora o mundo esteja transitando por um processo irreversível no avanço das conexões online, é importante lembrar que o homem é um ser adaptado naturalmente para viver em sociedade. 

“Desde que nasce, o indivíduo necessita de carinho, afeto e contato físico para sobreviver física e mentalmente saudável. A falta desse contato pode trazer diversos distúrbios, principalmente mentais, que pode causar baixa autoestima, sensação de abandono, exclusão, solidão e depressão”, destaca Solange. 

Dessa forma, restabelecer conexões pessoais traz benefícios mentais e emocionais e, por consequência, a possibilidade de estabelecer a saúde social. 

“A noção de conexão verdadeira só é possível com o convívio presencial, com o olho no olho entre as pessoas. Só assim podem ser criados laços verdadeiros e duradouros de amizade, companheirismo e amor”. 

Nesse sentido, a profissional adverte que o convívio online não traz uma experiência equiparável ao mundo real, uma vez que nesse universo, é mais fácil mentir ou “desligar” o indivíduo que contraria uma vontade ou opinião. 

“É no convívio social que o indivíduo pode aprender a lidar com as variedades de opiniões, com o sentimento de frustração e até com a alegria e bem-estar do convívio com pessoas da mesma opinião”, ressalta. 

Anseios da sociedade x autoconhecimento: como equilibrar a balança?

Se a reconexão entre as pessoas é o caminho para a saúde social, por que ainda enfrentamos tantas dificuldades com isso?

Para a terapeuta, um dos motivos é a manutenção do foco em aspectos estritamente materiais, alheios às questões essenciais do ser humano.

“Vivemos numa sociedade materialista, onde o ‘ter’ é muito mais importante do que o ‘ser’. A todo momento, somos cobrados a ter muitas coisas. Com isso, usamos todo nosso tempo preocupados em conquistar as coisas que nos são impostas, seja trabalhando em excesso, fazendo cursos técnicos, graduações ou malhando”, observa.

De acordo com ela, para conseguir esses objetivos, os indivíduos assumem uma postura de competição com aqueles que estão ao redor no trabalho, em casa e no convívio social em geral.

“Dessa forma, não sobra tempo para conhecer a pessoa mais importante na nossa vida, que é nós mesmos. Ficamos alienados de nossas necessidades e vontades. Sem esse conhecimento, como podemos saber quem somos, de onde viemos, para onde vamos e o que realmente precisamos, material, mental e espiritualmente?”, reflete. 

Para a profissional, a busca pelo autoconhecimento é o que pode ser decisivo para dirimir tal carência de completude.

“Enquanto não buscarmos conhecimentos eficientes sobre nós mesmos, nunca saberemos se o que estamos fazendo é o melhor para nós. Estamos apenas dando tiros no escuro, que ora podem dar certo e ora pode dar muito errado, nos levando para um buraco muito fundo e difícil de sair”.

Como diminuir a sensação de vazio em cada um de nós?

De acordo com a terapeuta, na maioria das vezes, é necessário buscar ajuda profissional para apoiar o indivíduo a lidar com suas frustrações, para entender as motivações dos sentimentos e o que é necessário fazer para mudar. 

“Só podemos diminuir a sensação de vazio em nós, se estivermos bem com nossas escolhas e decisões, se pudermos compartilhar com outros nossos pensamentos, sentimentos, sejam de vitórias, derrotas, conquistas e fracassos, se sentirmos que fazemos parte de algo maior do que somente nós e se entendermos o que precisamos realmente para nossa sobrevivência”. 

Ela completa: “ao buscarmos esse entendimento, podemos chegar à conclusão que precisamos de muito menos do que imaginamos e que existe algo além desta existência muito mais importante”.

Qual o papel da espiritualidade no contexto da reconexão social?

Para a terapeuta, entender que o indivíduo faz parte de algo muito maior do que o mundo material é a única maneira de encontrar sentido na existência. 

“Enquanto acreditarmos que somos apenas matéria, nossa existência não faz sentido. Acreditar que somos matéria significa acreditar que tudo acaba um dia, que a morte é o fim de tudo. Se isso é verdade, qual o sentido de viver se sacrificando para conseguir as coisas se vamos morrer e deixar tudo aqui? Qual o sentido de sofrer e passar dificuldades para aprender algo melhor, se ao morrer não vamos aproveitar esse aprendizado?” 

Nesse sentido, ela destaca que a espiritualidade tem o papel de dar esperança de que existe algo além da morte. “Só assim podemos ver um sentido em tudo pelo que passamos”, completa.

Para concluir, a profissional destaca que o importante é entender que cada indivíduo tem suas particularidades, sua forma de sentir e pensar sobre os acontecimentos pelo qual passa e que não existe uma fórmula mágica para resolver os problemas e nem um manual infalível.

“Por isso, uma ajuda profissional seja de psicólogo, psicanalista, terapeuta ou de qualquer pessoa que ajude a questionar seus conhecimentos, pode ser uma alternativa para ajudar na condução de um caminho mais rápido, menos dolorido e mais eficaz para descobrir suas respostas”, finaliza.

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