Claudia Papa Scarpa: sensibilidade e talento na indústria de seguros brasileira

Ela poderia ter escolhido o conforto e a estabilidade de trabalhar na empresa da família, mas decidiu ser independente e conduzir a carreira para fazer a diferença na democratização do acesso a produtos de seguro no país
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Claudia Papa Scarpa: “Um conselho que eu dou para muitas mulheres é que a gente tem que se atualizar dentro das nossas carreiras. A gente tem sempre que buscar o crescimento e entender o que há de novo no mercado pra se reciclar profissionalmente”. (Foto: Divulgação)

O nome é técnico: massificação de seguros, mas a intenção é nobre. Trata-se de pensar e desenvolver meios que permitam acesso à proteção com produtos de seguros ao maior número de pessoas possível. Gente simples que fica de fora das facilidades oferecidas pelo mercado financeiro.

Esta foi uma das principais causas de Claudia Papa Scarpa na carreira. Ela criou os primeiros produtos em grande escala oferecidos por meio de contas de luz, o que era revolução há quase 20 anos.

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A dedicação à indústria dos seguros e aos estudos a levaram longe. Nas companhias onde trabalhou, Claudia passou a assumir cargos de vice-presidência para cobrir toda a América Latina.

E tudo isso teve um divisor de águas quando ela era bem nova e precisou decidir entre trabalhar na empresa da família ou ser uma mulher independente. A escolha da segunda opção, logo depois de formada, foi determinante.

Acompanhe esta história inspiradora de uma mulher bem-sucedida que abriu mão da proteção familiar e escolheu o próprio caminho profissional.

Elas Que Lucrem: O que na sua história de vida te direcionou para trabalhar no mercado de seguros?

Cláudia Papa Scarpa: Eu nasci de uma família de italianos. Meu pai tinha origem italiana e minha nona e meu nono – avós em italiano – tiveram só filhos homens e se orgulhavam disso. Eram muito machistas. Mas, por incrível que pareça, a segunda geração, foi praticamente só de mulheres. Somos 13 netas e mais três netos. Pra minha nona, lugar de mulher era ser dona de casa cuidando do marido e da cozinha. Algo que, desde pequenininha, eu soube que não ia fazer. Do lado da minha mãe, era uma mistura de alemães com portugueses de classe média. Então, as mulheres eram bem fortes e já trabalhavam. Meu pai e minha mãe tiveram quatro mulheres criadas para ser o que quisessem. Esse foi o primeiro ganho que tive. Apesar da criação machista, meu pai viu que tinha que incentivar a gente a realmente estudar e batalhar pelo que a gente queria.

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Eu era muito levada na escola e, na adolescência, fiquei pior ainda. A minha mãe era sempre chamada no colégio pelo meu comportamento. Quando eu ficava de castigo, ela me mandava trabalhar à tarde na loja que ela tinha. Aí, eu descobri que queria ser independente mesmo, que queria trabalhar e ganhar o meu dinheiro.

Quando eu me formei na faculdade, fui trabalhar com a família do meu pai. Eram bem machistas, mas fui com eles primeiro no segmento financeiro e, depois, na concessionária de veículos Fiat que eles tinham. Eu era muito jovem ainda, tinha 22 anos. Meu sonho era morar na Itália porque queria ver as origens da minha família. Então, batalhei duro para ter relacionamento com a fábrica da Fiat. Para todo diretor que eu conhecia, eu pedia que me mandasse fazer um estágio na fábrica. Até que, um dia, eu consegui.

EQL: Como foi esta experiência?

CPS: Meu estágio foi em Torino, na Itália, começando como operária na linha de montagem do Fiat Punto e, depois disso, passando por todas as áreas da Fiat.  Ali, eu descobri que, realmente, eu queria trabalhar em multinacional e ser independente da minha família. Um ano depois, eu voltei para o Brasil e entrei em uma multinacional de Telecom. Um ano depois, eu tinha uma amiga que estava no mercado de seguros que me apresentou à Affinity. Foi amor à primeira vista e ingressei na companhia há 21 anos. É o tempo em que estou no mercado de seguros de onde nunca mais saí. Comecei como gerente e estava começando no Brasil a venda de seguros massificados. Nós criamos o primeiro projeto de seguros massificados que era a venda de seguros a preços acessíveis dentro da conta de luz para pessoas que, de fato, não podiam ter acesso a produtos de seguros em outros canais. Aquilo foi um sucesso e um segmento pelo qual me apaixonei. O seguro massificado permite a inclusão social de milhões de brasileiros para produtos financeiros e serviços de seguros que não eram acessíveis antes para essa população. Eu fiquei 15 anos nessa empresa. Entrei como gerente e, no final, saí como diretora da América Latina. Nesse período, eu me casei. Meu marido é mais velho, tem 18 anos a mais do que eu, e ele sempre apoiou muito a minha carreira e batalhou muito para eu crescer.  

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Recebi da empresa um convite para morar na Argentina e nós nos mudamos para lá. Aí, eu decolei na minha carreira. Quando voltei para o Brasil, fui convidada para trabalhar em uma seguradora italiana. Uma multinacional que era a Generali. Entrei já como vice-presidente da companhia onde fiquei nove anos trabalhando em outros ramos de seguro, não só massificados, mas desenvolvendo a área de massificados para a companhia. Então, foi um período maravilhoso dentro da minha carreira. Oito meses atrás, eu recebi um convite da empresa em que estou atualmente, uma companhia americana, para ser vice-presidente da América Latina.

Claudia Papa Scarpa: “Meu sonho era morar na Itália porque queria ver as origens da minha família. Então, batalhei duro para ter relacionamento com a fábrica da Fiat. Para todo diretor que eu conhecia, eu pedia que me mandasse fazer um estágio na fábrica. Até que, um dia, eu consegui”. (Foto: Divulgação)

EQL: Você que enfrentou o machismo dentro da família logo nos primeiros anos de sua vida. Como foi encarar situações profissionais neste sentido? Você já estava preparada?

CPS: Entrei em um segmento que é o de seguros considerado bem machista. Se a gente for olhar aquela época em que entrei há 21 anos, as estatísticas de mulheres em cargos de liderança eram muito pequenas. Na verdade, era um segmento com o C-Level das companhias formado, praticamente, só por homens, com raríssimas exceções de mulheres presentes no mercado. E assim mesmo, em áreas que não eram de liderança. Acho que isso mudou muito ao longo da minha carreira.

Eu me lembro quando entrei no primeiro emprego em seguros, eu tinha que viajar muito e pegava estrada, muitas vezes, à noite. A minha mãe falava: “Filha, mas é perigoso você ir sozinha”. Eu falava: “Mãe, se eu não fizer, vai ter um homem que faça”. Eu acho que, naquele momento, o mercado não era preparado para associar a voz da mulher à voz da liderança. Mas acho que, ao longo destes 21 anos, a gente percebe que isso tem mudado. Hoje, existem várias mulheres que ocupam cargos de C-Level como presidentes de companhias de seguros e CEOs.

Mas posso te falar que eu nunca senti um preconceito por ser mulher. Fui criada, realmente, para batalhar e mostrar que era capaz. Fui me capacitando cada vez mais para mostrar que gênero não fazia a diferença dentro da carreira que eu escolhi.

EQL: No segmento de seguros, quais os desafios internos em se tratando de mercado brasileiro?

CPS: Acho que o Brasil, até hoje ainda, tem uma capacidade enorme para crescer no segmento de seguros. Se a gente compara o percentual de seguros dentro do PIB do Brasil em relação a países desenvolvidos, nós ainda estamos muito atrasados. A gente tem de 3% a 3,5% de penetração com seguros no PIB – Produto Interno Bruto – do Brasil. Quando a gente olha mercados como Estados Unidos, isso está na casa de 8% a 9%. Mesmo em alguns países latino-americanos como Chile, já está em 6% a 6,5% do PIB. E qual era o grande desafio aqui? A massificação da oferta de seguros. Antigamente, as pessoas tinham acesso a seguros através de corretoras ou por meio de suas empresas ou bancos. Mas a população menos favorecida não tinha acesso e, muitas vezes, nem ‘bancarizada’ era. E o seguro é algo muito importante para a proteção das famílias. A gente olha agora, depois de ter passado por uma pandemia, que ninguém havia pensado que fosse viver por tanto tempo um momento tão difícil como o que a gente viveu e a importância de, realmente, você ter seguro para proteger a sua família, a sua saúde, a saúde dos seus, e para dar uma tranquilidade para as pessoas que você mais ama. Então, acho que, hoje, a gente ainda tem uma oportunidade enorme de levar proteção às famílias brasileiras e de tornar o seguro cada vez mais acessível a qualquer classe da população. Por isso, eu me apaixonei perdidamente por esse segmento de afinidades, ou de seguros massificados como a gente chama, porque a gente dá acesso a milhões de brasileiros a produtos de alto valor agregado e baixíssimo custo financeiro para que eles possam proteger suas famílias e as pessoas que mais amam.

Claudia Papa Scarpa: “Eu nunca senti um preconceito por ser mulher. Fui criada, realmente, para batalhar e mostrar que era capaz. Fui me capacitando cada vez mais para mostrar que gênero não fazia a diferença dentro da carreira que eu escolhi”. (Foto: Divulgação)

EQL: Há produtos específicos para as mulheres no segmento de seguros?

CPS: Sim. A gente tem um dos seguros mais famosos que é o de diagnóstico de câncer feminino ou doenças graves ligadas à mulher. Há também o seguro de perda de renda, a cobertura para casamento em caso de divórcio, além de produto para a graduação de filhos. Hoje, a gente tem uma gama de produtos dentro do mercado brasileiro que protege as famílias e a mulher. A gente tem que pensar hoje que, dentro da população, muitas mulheres são chefes de família e responsáveis pelo sustento da sua casa, pela educação dos seus filhos e elas precisam ter acesso a alguma proteção.

EQL: Se há uma questão cultural ainda a ser resolvida para facilitar o acesso dessas pessoas e fazer com que elas entendam a importância do seguro, o que é necessário fazer?

CPS: É um trabalho de toda a sociedade. Obviamente, empresas e governo precisam incentivar a educação financeira dessas famílias e dar acesso a produtos financeiros de seguros e serviços de forma democrática a toda a população brasileira. O papel dos seguros massificados é exatamente esse. Existem canais hoje como bancos, bancassurance – bancos associados a companhias de seguros, além de empresas financeiras, redes de varejo e empresas de telefonia que têm um papel muito grande de levar essa oferta de seguros a seus clientes.

Mas eu acho que a Elas Que Lucrem tem um papel fundamental que eu admiro muito porque é um trabalho efetivamente da educação financeira das mulheres, das famílias, e eu acho que é por aí. Eu diria que a Elas Que Lucrem é uma das entidades que mais fazem essa educação financeira para que as mulheres que são chefes de família consigam ter sua proteção e sua independência financeiras.

Com Eduardo Scarpa: “Meu marido é mais velho, tem 18 anos a mais do que eu, e sempre apoiou muito a minha carreira e batalhou muito para eu crescer”. (Foto: Reprodução/Instagram)

EQL: Como foi conciliar as grandes exigências profissionais com a vida pessoal?

CPS: Eu acho que a mulher, desde que nasce, é multitarefas. A mulher está acostumada a fazer dez coisas ao mesmo tempo: dirigir, passar batom, olhar a vitrine do lado e estar pensando no trabalho, nas compras de supermercado que tem pra fazer. A gente sabe e aprende desde pequenininha a equilibrar os pratos. Eu me desenvolvi muito estudando. Me dedicando muito à minha carreira, mas também me dedicando à minha família. E o curioso é que, antigamente, os filmes que a gente via na Disney eram de mulheres que ficavam à espera de um príncipe encantado. A gente via a Cinderela, a Branca de Neve, que eram sempre histórias de princesas que ficavam ali à espera de um príncipe encantado lindo e maravilhoso para se casarem, serem felizes, terem filhos, e não fazerem mais nada. Hoje, a própria Disney já mudou, a exemplo da Frozen, com exemplos de mulheres independentes. Até a educação que a gente dá a partir dos filmes que a gente passa para nossas meninas já mostra a independência da mulher. De que ela pode ser muito mais do que só mulher. Ela pode ser mulher-executiva-dona de casa- chefe de família, tudo ao mesmo tempo e ser feliz.

EQL: E tempo para tudo isso?

CPS: A gente sempre arruma um tempo. Eu falo que, quanto mais ocupada a gente está, mais a gente arruma tempo para as coisas que a gente quer fazer. Eu percebo muitas pessoas que, às vezes, têm dias livres e, independente de gênero, acham dificuldade de achar tempo para fazer alguma coisa. Mas nós que trabalhamos, cuidamos da casa, cuidamos do marido, fazemos supermercado, somos chefes de família, aprendemos a equilibrar esse tempo para dedicar tanto ao trabalho, quanto à vida pessoal e ao cuidado físico. As mulheres têm esse desafio de ser elásticas para conciliar muitas coisas ao mesmo tempo.

EQL: Quais são suas metas na carreira?

CPS: Eu tenho hoje um grande desafio profissional nesta nova empresa que é de crescer, mas junto com isso, tenho o desafio pessoal da volta aos estudos. Estou fazendo um máster e tirando uma certificação para conselheira de inovação. Estou conciliando tudo: o meu trabalho, estudos à noite e minha família. Voltar a estudar realmente me abriu a mente. Acho que, hoje, o mercado está ágil, o mundo está globalizado, e as mudanças vêm acontecendo de uma maneira rápida e com novas tecnologias, novas moedas. Hoje, a gente fala de metaverso, NFTs, então eu resolvi me atualizar e dedicar minhas noites ao estudo. Um conselho que eu dou para muitas mulheres é que a gente tem que se atualizar dentro das nossas carreiras. A gente tem sempre que buscar o crescimento e entender o que há de novo no mercado pra se reciclar profissionalmente.

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