De unhas pintadas à cremação: como Adriane Lupetti criou uma assessoria que está revolucionando o mercado funerário

Inaugurado em janeiro de 2022, o Memorial Jardim da Vida foi criado para alentar famílias no momento da despedida
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Divulgação
Inaugurado em janeiro de 2022 por Adriane Lupetti, o Memorial Jardim da Vida recebeu investimentos de R$ 13 milhões (Foto: Divulgação)

Há cinco anos, quando a arquiteta e urbanista Adriane Lupetti decidiu fazer uma pós-graduação focada em perícias da engenharia, uma reflexão surgiu em sua vida. Até então, ela empreendia na área da arquitetura e tinha certeza que esse era o caminho certo para a sua carreira. O que mudou, na realidade, foi a percepção de que havia um segmento de mercado extremamente desatualizado no Brasil: o setor funerário – o que é irônico, já que todos levam a morte como a única certeza da vida. 

Mesmo assim, por mais que seja um mercado em constante movimento, que inclusive passou por crescimento nos últimos anos por conta da pandemia de Covid 19 – de acordo com os últimos dados divulgados pela Associação Brasileira de Empresas e Diretores do Setor Funerário (Abredif), o setor cresceu 30% entre março de 2020 e outubro de 2021 -, o assunto não costuma ser foco de inovações. Culturalmente, o Brasil não fala sobre a morte, e talvez esse seja o grande problema da questão. 

Ao fazer uma pesquisa na área de perícia ambiental na pós-graduação, Adriane decidiu estudar a sustentabilidade dos cemitérios. O que seria mais sustentável: cemitérios horizontais ou verticais? A resposta é que cremar é mais sustentável do que sepultar, mas não foi essa conclusão que chamou a atenção da arquiteta. Durante o estudo, ela entrou em contato com muitas pessoas, e isso fez com que percebesse as experiências traumáticas que envolviam o tema. “Todos reclamavam da burocracia e da frieza para tratar as pessoas em um momento tão delicado”, recorda. 

Naquele momento, além de entregar a pesquisa sobre os benefícios da cremação para pilares como meio ambiente, psicológico familiar e – surpreendentemente – até para o bolso, Adriane começou a refletir sobre como os outros países lidavam com a morte.  “Eu morei um ano na Espanha e foi o bastante para que eu percebesse o quanto o europeu tem uma relação muito diferente com a despedida. Eles fazem tudo com mais calma. Nós sempre precisamos fazer tudo na correria, com muito sofrimento”, explica a arquiteta. “Não conseguia parar de pensar em como deixar esse processo mais leve, até que me veio a ideia de criar uma assessoria onde eu pudesse guiar os familiares pelas burocracias do mercado funerário.” 

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De forma prática, ela resume bem o conceito de sua ideia empreendedora: “Em um casamento, é gostoso escolher as coisas. Em um enterro, é um pesadelo”. Segundo a empreendedora, é preciso fazer cerca de 72 escolhas após um falecimento. Documentos hospitalares, assinaturas de cartório, avisar amigos e familiares, escolher o caixão, a urna, a cerimônia e até mesmo a roupa e os acessórios. Tudo isso num momento em que os familiares estão psicologicamente abalados, sem nem saber por onde começar.

E Adriane sentiu na pele esse desespero. No meio do processo, quando a ideia de criar uma assessoria funerária tomava forma por meio do espaço Memorial Jardim da Vida, sua mãe faleceu. “Foi aí que ficou ainda mais claro o quanto a assessoria era importante”, lembra. “Todos nós perdemos o chão e, em momentos assim, dá branco. Sabemos o que precisamos fazer, mas não por onde começar. É o impacto do abalo emocional.” Além disso, Adriane conheceu a falta de sensibilidade de que tanto ouvia falar. “Eu escolhi um cemitério particular para fazer a cerimônia da minha mãe, mas, ainda assim, foi um show de horrores. O espaço era ruim e meu pai não conseguia chegar perto da minha mãe direito para dar um beijo. Não colocaram as fotos que eu pedi no telão. O cerimonialista era ruim. Eu senti falta de humanidade.” 

Com tantos problemas, claro que ninguém perguntou como Adriane gostaria de arrumar sua mãe para o momento. “Ela sempre estava com as unhas impecáveis e amava cor de rosa. Estava sem esmalte por conta dos procedimentos hospitalares, então eu decidi pegar uma das cores que ela gostava e pintar sua unha. Era só um detalhe, mas foi importante para a família”, conta. “Um amigo de infância até se aproximou de mim no velório e disse: ‘Sua mãe é incrível mesmo. Até nessa hora ela está com a unha pintada’. Eu fiquei tão emocionada que não consegui contar que tinha sido eu.” 

O acontecimento fez com que a arquiteta abraçasse ainda mais o propósito de seu negócio. Faria de tudo para levar empatia ao mercado funerário. “Não quero ouvir ninguém falando que a despedida de um ente querido foi o pior momento de sua vida. Quero que as pessoas saiam da cerimônia sabendo que seu familiar teria adorado a homenagem.” 

Conforto físico e emocional

Inaugurado em janeiro de 2022 na região de Tamboré, próximo a Alphaville, em São Paulo, o Memorial Jardim da Vida recebeu investimentos de R$ 13 milhões e conta com um grupo de 18 sócios-investidores. A obra, que teve duração de um ano e três meses, possui 3.330 metros quadrados de área construída, quatro salas para cerimônias e um espaço para meditação –  e, claro, todo o complexo foi todo desenhado e assinado por Adriane, que levou o seu amor pela arquitetura para o empreendimento. Para ela, é importante deixar claro que o espaço não é uma funerária ou um crematório. 

Embora tudo seja personalizado, Adriane faz questão de reforçar uma característica que todos os atendimentos têm em comum: o conforto reservado às famílias (Foto: Divulgação)

Embora ofereça o serviço de cremação, o foco do atendimento é a assessoria. “Fazemos o trabalho de ponta a ponta. Tudo é personalizado para cada família: cremação, documentos para sepultamento, cerimônia e até traslado. Cada caso é único”, explica. Quando se trata de preço, os planos começam em R$ 6.000 e podem chegar a R$ 35 mil. “Tem famílias que gostam de grandes eventos, enquanto outras preferem cerimônias mais simples, por isso o preço varia tanto. Alguns contratam bufês, violinistas e arranjos de flores, por exemplo.” 

Embora tudo seja personalizado, Adriane faz questão de reforçar uma característica que todos os atendimentos têm em comum: o conforto reservado às famílias. “As salas possuem ar-condicionado, lareira, aromaterapia, musicoterapia, móveis confortáveis e até câmeras de transmissão full time para familiares e amigos que estejam em outros países ou estados.” Do lado de fora do espaço, junto ao bosque do terreno, também é possível plantar uma árvore nativa da Mata Atlântica juntamente com as cinzas em urnas biodegradáveis.

“Dessa forma, vamos recompondo a mata nativa ao mesmo tempo em que criamos um memorial vivo”, explica a arquiteta. “Nosso compromisso é cuidar bem das pessoas e transformar o momento da despedida em um ato de amor. Um luto mal vivido é um trauma para o resto da vida. Precisamos ter experiências que nos permitam seguir.”

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