Etarismo no mercado de trabalho afeta mais as mulheres

Empresas podem mudar o cenário promovendo ações para contratar mulheres com mais experiência
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Em uma entrevista dada em 2014, a atriz Meryl Streep disse: “quando eu tinha 40, me ofereceram três papéis de bruxas. Não me ofereceram qualquer aventura feminina ou sobre qualquer coisa sobre interesses amorosos, heróis ou demônios. Me ofereceram bruxas, porque eu era velha aos 40 anos.” Quase 10 anos se passaram dessa declaração, e para a maioria das mulheres, a realidade é ainda mais amarga: ingressar no mercado de trabalho ou conseguir uma promoção após os 40 pode ser difícil.

Na época da declaração, Streep poderia ter se aposentado confortavelmente, o que não é a realidade da maioria das brasileiras. “Aqui as bruxas são outras”, brinca a psicóloga e consultora de RH Bruna Silva. “Além de enfrentarem o processo de preconceito por serem mulheres, ainda vemos dois pesos e duas medidas com relação ao envelhecimento do homem e da mulher”, afirma. Ainda podemos continuar citando Hollywood nesta comparação. Aos 47 anos, Pedro Pascal ganhou papéis de destaque em The Last of Us e The Mandaloriam, e tem sido chamado de novo símbolo sexual. “Não conheço uma mulher grisalha, com rugas, no mesmo perfil do astro, que ganhe esse título”, completa Bruna.

Deixando a realidade do cinema de lado, no mundo “real” o mercado de trabalho é ainda mais crítico para os mais velhos. Artigo publicado pelo portal Catho em 2018 apontou que apenas 3% de profissionais idosos estavam empregados nas 150 melhores empresas para se trabalhar. Isso mostra que o etarismo é uma realidade no país.

Fernanda Lopes, especialista em contratações, diz que as empresas promovem cortes e demissões, substituindo contratos longos de CLT por profissionais mais jovens e com menos direitos trabalhistas. “As pessoas estão vivendo mais, portanto, as empresas precisam se preparar para absorver essa força de trabalho. Além disso, com a reforma da previdência, as pessoas vão demorar mais para conseguir se aposentar e vão precisar trabalhar mais tempo. ”

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De acordo com o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), no segundo trimestre de 2022, a taxa de mulheres desocupadas era 54,7% maior que a dos homens. Embora o nível de escolaridade das mulheres seja superior ao dos homens (apenas 21,5% dos homens frequentaram o ensino superior, contra 29,75% das mulheres), o mercado de trabalho não reflete essa situação. Ainda segundo o IBGE, mulheres possuem menor participação na força de trabalho, cargos menos valorizados e menores salários.

Uma grande empresa do setor de gás encanado lançou um programa em agosto de 2022 para empregar mulheres acima dos 40 anos. Chamado “Mulheres de talento 40+”, o programa conta com programas de capacitação e treinamentos. De acordo com o site da companhia, a ideia é “alcançar a igualdade de gênero na tomada de decisões”.

Bruna diz que a iniciativa é importante e digna de ser implementada por outras companhias. “Vemos no mercado uma dificuldade em absorver mulheres mais velhas, especialmente as com filhos. Em 2023 ainda temos chefes jovens que não gostam de ter abaixo deles pessoas mais experientes”, afirma.

Mulheres incomodam na chefia

Dados da pesquisa “Atitudes Globais pela Igualdade de Gênero”, publicada em 2019 pela Ipsos, três em cada 10 pessoas no Brasil admitiam se sentirem desconfortáveis em ter uma mulher como chefe.

Cínthia Mara, de 45 anos, é gestora de compras em uma grande empresa de São Paulo e conta como chegou lá. “As promoções foram acontecendo naturalmente, mas sempre senti que precisava me esforçar muito mais que meus colegas homens para mostrar meu valor. Quando cheguei a um cargo de liderança com vários profissionais abaixo de mim, tive de me aproximar de cada um deles para ganhar a confiança e conseguir os resultados que queria para a equipe. Sei que preciso provar todos os dias que mereço estar onde estou, não vejo isso em meus colegas homens”, conta.

Cínthia diz que liderar mulheres é mais fácil, e compôs uma equipe majoritariamente feminina. “70% do meu time é de mulheres e tenho duas colaboradoras com mais de 40 anos. Trabalhar com essas pessoas é um privilégio: são pessoas experientes, que não se frustram com qualquer situação, têm mais jogo de cintura e conseguem solucionar problemas com mais facilidade”, conta.

De acordo com Bruna, essas são apenas algumas das vantagens desse perfil de trabalhadora. “Existem diversos estudos que mostram como mulheres podem ter competências diferenciadas e muito valorosas em diversos cargos, inclusive os de liderança”.

Políticas precisam ser constantes

Fernanda e Bruna são unânimes sobre as soluções para o etarismo, em especial para mulheres. “As políticas de contratação e promoção de mulheres e de mulheres de mais de 40 anos precisam ser constantes, e não apenas para fazer a empresa parecer diversa, descolada” especifica Bruna.

Para Fernanda, se a empresa não costuma manter em seu quadro de funcionários profissionais mais velhos, se os cortes são constantes para gerar economia, é sinal de que ela não irá contratar profissionais mais velhos. “A lição primeiro tem que ser feita dentro de casa. Entender que o mercado mudou, que o país não é mais tão jovem e que teremos pessoas mais velhas buscando emprego, é um começo”, conclui.

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