Pela sua liberdade de dizer não à maternidade: mais que um desejo, uma responsabilidade 

Em nosso contexto social, não querer ser mãe é considerada uma decisão difícil, mas você não está sozinha. Saiba mais sobre a ‘Geração NoMo’ – ‘Not Mothers’

E aí, quando você vai engravidar? 

Qual mulher não escutou uma pergunta dessas dentro das suas relações de convívio, seja na família, no círculo de amigos ou até mesmo no trabalho? Quase impossível. 

Historicamente, o papel da mulher inclui a maternidade como ideal de realização pessoal e felicidade. Porém, não há muito tempo, esse cenário vem mudando e cada vez mais mulheres tomam a decisão de não se tornarem mães, ou, às vezes, adiam esses planos por conta de outras realizações que não combinam tanto com a maternidade.

Nesse sentido, inclusive, tem sido divulgado um novo termo para caracterizar esse movimento que vem ganhando força no mundo inteiro, é a Geração NoMo – Not Mothers, em tradução livre “não mães”.   

Mas, o tema não é tão simples assim. A pressão social ainda existe e, por isso, decidimos conversar com duas especialistas sobre o tema, para entendermos melhor como lidar com a decisão de não querer ser mãe. 

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É com esse nome que a funcionária pública federal, Niriane Neuman, 41 anos, criou um espaço no Instagram para conversar a respeito do tema. 

Niriane nos conta que tirou a ideia do papel com base em sua própria referência. “O meu processo de decisão quanto a ter ou não filhos foi muito solitário. Eu não encontrava com quem conversar sobre isso, não tinha quase nenhuma referência de mulheres sem filhos e não havia praticamente nada de conteúdos que tratassem da não-maternidade por opção. Daí, quando me senti decidida e segura, entendi que precisava apoiar outras mulheres na mesma situação. Criei um canal que eu gostaria de ter tido acesso na época.”.

Segundo ela, mesmo com a convicção de que haviam outras em seu processo solitário de decisão, ela se surpreendeu com a quantidade de mulheres que se identificavam com o perfil e o conteúdo. Porém, Niriane percebe que apesar do tema já ser mais amplamente discutido, a culpa e dúvida ainda existem. 

“São pressões externas, julgamentos e até hostilizações que essas mulheres vivem durante o seu processo. E isso é consequência do sistema de maternidade compulsória que faz parte uma sociedade predominantemente patriarcal e machista, que doutrina a mulher de forma que a maternidade não é uma escolha, mas um destino.”, afirma. 

Essa convicção é confirmada pela terapeuta de ginecologia natural e sacerdotisa do sagrado feminino, Di Cesario, de 37 anos, brasileira que há 15 anos vive em Portugal: “A maternidade é contada historicamente como uma realização pessoal e uma parte fundamental na vida de uma mulher, e isso faz com que se sintam desvalorizadas, vazias e fracassadas se não forem mães. E o tempo presente permanece com essas raízes históricas de comportamento. É algo geracional”.   

“As mulheres ainda estão desconectadas com o seu próprio corpo, e ainda acreditam quando são relacionadas a uma fábrica de bebês. Na escola ou no ambiente familiar não recebemos as informações completas. O meu propósito é precisamente despertar mulheres para que voltem a se reconectar com a sua essência e potência. Elas ainda ficam curiosas e surpresas quando digo que somos também férteis para nós mesmas”, complementa Di.

‘Geração NoMo’ – ‘Not Mothers’ 

Em 2022, a partir de um levantamento mundial promovido pela farmacêutica Bayer, com apoio da Federação Brasileira das Associações de Ginecologia e Obstetrícia (Febrasgo) e do Think About Needs in Contraception (Tanco), foi divulgado que 72% das mulheres no mundo não desejam ser mães, e, no Brasil, esse número está em 37%. 

Esse movimento global está sendo chamado de Geração NoMo, como antecipamos anteriormente, e demonstra o quanto as mulheres estão repensando os seus espaços, as suas escolhas e decisões, a partir das suas próprias convicções, sonhos e desejos.

Porém, nem sempre essa conversa é fácil. Não só com os parceiros ou pessoas queridas e de confiança, como também com nós mesmas. A definição do sim ou não, menos ainda. Afinal, qual é o aspecto que sentencia que realmente não quero ser mãe?

Para a terapeuta Di, o ponto de partida desse tema está no autoconhecimento. “Assim, você consegue perceber as suas emoções, motivações, os pensamentos e comportamentos. Identifica os seus medos, as fraquezas e as próprias crenças limitantes. Antes de tudo você precisa se conectar com a sua consciência para sustentar a definição com confiança.”. 

Niriane concorda. “Uma decisão verdadeira exige um profundo processo de autoconhecimento, aliado com a compreensão do que significa maternar, sem a romantização que vemos nas redes sociais, principalmente. É saber a vida real e definir se há espaço na sua para tal, ou se é possível adequar para conceber isso. A decepção da maternidade lúdica é forte e pesada. Além disso, ignore as influências externas, para o sim e para o não, essa experiência é apenas sua.”. 

Porém, é importante destacarmos aqui que esse processo de autoconhecimento não é algo que acontece da noite para o dia. É preciso paciência e gentileza consigo mesma. Além disso, pode ser necessário recorrer a ajuda profissional, como terapeutas e psicólogos.

“A terapia é autoconhecimento. Com ela você conquista ferramentas para identificar os seus problemas e questões que afetam a sua vida, e meios para lidar, e sustentar desafios e decisões como essa. Você não estará evitando um problema, mas sim ganhando maturidade para resolver, com uma nova visão, tolerância e amabilidade.”, afirma a Di.    

Pela sua liberdade de dizer não à maternidade

A nossa vida, e a de qualquer ser humano, não precisa obedecer um padrão comum de experiência e nem ter uma ordem obrigatória a ser cumprida. Assim como você não precisa fazer uma faculdade para ter uma profissão, ou comprar um carro para ir de um lugar a outro, você não precisa necessariamente casar-se e ter filhos, desde que isso não seja o seu desejo.

“Pode parecer óbvio, mas você não precisa ser mãe. A minha dedicação em falar sobre a não-maternidade não é uma apologia, mas sim um convite à reflexão de que outras realidades são possíveis. Há uma diversidade enorme entre as pessoas, não somos todas iguais, temos histórias de vida, sentimentos e percepções diferentes, então porque obedecer um caminho linear? Acredito que quanto mais representatividade tivermos das mais variadas experiências humanas, mais pertencentes e acolhidas nos sentiremos. É um movimento social importante.”, finaliza Niriane. 

“Acima de tudo sou mulher e como outras mulheres também sinto a pressão social nos mais diversos aspectos. Existem decisões com base em nossas crenças, nosso ego e até para ceder pressões, mas temos que nos lembrar que o respeito é o percurso mais generoso. Além dos deveres e direitos, temos liberdade de escolha. É difícil, mas é possível. O meu papel é mostrar que não há certo ou errado, apenas pontos de vista distintos, e que é preciso coragem para fazer aquilo que lhes faz sentido.”, finaliza Di. 

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