É funcionária pública e foi vítima de violência doméstica? Conheça os seus direitos

Entenda como funciona os pedidos de deslocamento de servidoras públicas por motivos de violência doméstica
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Viver uma situação de violência doméstica é um marco traumatizante na vida de qualquer mulher. Nos sentimos incapazes, culpadas e vulneráveis dentro do nosso próprio direito de existir e de ser respeitada. 

O assunto, apesar de hoje ser amplamente discutido e já respaldado por Lei, ainda é desconfortável e, muitas vezes, ainda obscuro em suas iniciativas, e soluções de como proceder para se defender e se proteger. 

No caso de mulheres que exercem funções em cargos públicos, o tema ganha um viés diferente, pois, por conta da legislação, parece quase impossível se afastar do problema sem abrir mão do emprego. 

Porém, há caminhos que podem ser percorridos e é isso que vamos conversar neste artigo, junto com o olhar atento de uma advogada especialista no assunto. 

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Violação de direitos 

A violência doméstica infelizmente é uma realidade em muitos lares brasileiros. De acordo com a quarta edição do levantamento realizado pelo Fórum Brasileiro de Segurança Pública, que recebe o nome de Visível e Invisível: a Vitimização de Mulheres no Brasil, o total de mulheres vítimas de violência em 2022 chegou ao marco de 18,6 milhões. 

Esse total seria o suficiente para lotar estádios de futebol, com capacidade para 50 mil pessoas, diariamente. Ainda pela pesquisa, entre as mulheres entrevistadas, 11,6% relatam casos de agressões físicas, como socos, pontapés e tapas. Além de outras queixas comuns como violência verbal, 23,1%, perseguição, 13,5%, ameaças, 12,4%, ofensas sexuais, 9%, espancamento e tentativa de estrangulamento, 5,4%, ameaça por arma de fogo ou objeto cortante, 5,1%.  

Desses casos, um dado que reforça que o perigo está dentro de casa ou próximo a essa mulher é que 31,3% acusam ex-companheiros e 26,7% o parceiro íntimo atual.

Olhar para os dados é uma análise importante para que possamos ter as evidências necessárias de que uma mudança de comportamento precisa ser feita por todos da sociedade. E o acesso à informação e o conhecimento de como mudar uma situação de violação aos seus direitos à vida, é um grande começo. 

A Lei Maria da Penha (Lei nº 11.340/2006) que tem por objetivo criar mecanismos suficientes para coibir a violência doméstica e familiar contra a mulher de maneira geral. Porém, essa Lei parecia não estar alinhada com outra referente à remoção de funcionárias vítimas de violência, em seus cargos públicos. Essa diferença já foi percebida e você vai entender melhor ao longo do artigo.  

O que é a remoção de uma servidora pública? 

A remoção não é a perda da função e do cargo público, ao contrário, é apenas um pedido de deslocamento da servidora para uma mudança de sede, considerando o âmbito do quadro a qual ocupa. 

Ou seja, quando um servidor público, em geral, passa por um processo de remoção, ele está saindo de um local de trabalho e se dirigindo a outro, mantendo o seu nível e função registrada pelo diário oficial. 

A remoção está registrada no artigo 36 da Lei nº 8.112/90 do Estatuto dos Servidores Federais e espelhado na grande parte dos Estatutos de Servidores Estaduais e Municipais, da seguinte forma: 

Art. 36. Remoção é o deslocamento do servidor, a pedido ou de ofício, no âmbito do mesmo quadro, com ou sem mudança de sede.

Parágrafo único. Para fins do disposto neste artigo, entende-se por modalidades de remoção:

I – de ofício, no interesse da Administração;

II – a pedido, a critério da Administração;

III – a pedido, para outra localidade, independentemente do interesse da Administração:

a) para acompanhar cônjuge ou companheiro, também servidor público civil ou militar, de qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, que foi deslocado no interesse da Administração;

b) por motivo de saúde do servidor, cônjuge, companheiro ou dependente que viva às suas expensas e conste do seu assentamento funcional, condicionada à comprovação por junta médica oficial;

c) em virtude de processo seletivo promovido, na hipótese em que o número de interessados for superior ao número de vagas, de acordo com normas preestabelecidas pelo órgão ou entidade em que aqueles estejam lotados.

Como é possível perceber, especificamente neste artigo 36 não há nenhuma evidência que contemple os casos de vítimas de violência doméstica. 

Mudanças no Legislativo 

De acordo com a advogada de mulheres, Tuane Tarques, de 29 anos, de Pelotas/RS, apesar de não haver no estatuto essa previsão, a Administração pública pode e deve deferir todos os pedidos das servidoras nesse sentido. 

“Na própria Lei Maria da Penha em seu art. 9º há uma previsão legal de acesso prioritário de remoção de mulheres em situação de violência doméstica quando servidora pública da administração direta e indireta.”, afirma.

Além disso, ela nos conta que há novidades no nosso legislativo. “Há um projeto de Lei, Lei 943/23, que garante o direito de acomodação e remoção em outra unidade, com sigilo nos atos de publicidade oficial, e sem prejuízo salarial.”, 

“Esse projeto é recente e muito importante, pois inclui a medida na Lei Maria da Penha, que já garante às vítimas de violência doméstica manutenção do vínculo trabalhista, quando necessário o afastamento do local de trabalho, por até seis meses.”, conta. 

Saiba como pedir a remoção

Ter a ótica dessas Leis e projetos irá ajudá-la a ter as ferramentas necessárias para tomar a sua decisão. Porém, isso pode ser ainda meio confuso de como devemos seguir nessa situação, e, para isso, a advogada nos explica o passo a passo.

“O pedido de remoção deve ser feito do próprio órgão público ao qual a servidora é vinculada, na maioria das vezes, preenchendo um formulário padronizado para o objetivo. Junto a esse documento, você deve anexar um outro com o detalhamento do seu relato, demonstrando que a sua história de vida e integridade física está dependendo desse pedido de remoção.”, afirma. 

“O propósito deste segundo documento é que a pessoa que irá julgar o seu pedido, tenha as informações necessárias sobre a sua situação. De toda forma, caso seu pedido seja indeferido, ou seja, negado, você ainda poderá recorrer ao judiciário. Para isso, é muito importante que você conte com um apoio profissional, seja nesse segundo momento ou durante todo o processo.”, completa. 

Dentro deste aspecto, é significativo reforçarmos que toda essa iniciativa não tem como finalidade prejudicar a sua situação trabalhista, como muitas mulheres podem pensar e temer. Aqui estamos direcionando para que você tome as medidas legais preservando o seu emprego. 

Seja a voz dessa luta

Há mudanças sendo feitas nesse exato momento que vivemos e que são de grande relevância para conhecimento mais geral. Como parte desse contexto, precisamos aproveitar as oportunidades que temos acesso para repassar a outras e outros, até que isso se torne um ciclo produtivo de cuidado e proteção conjunta.  

“É importante lembrar que todas as pessoas são responsáveis no enfrentamento à violência, seja ouvindo uma pessoa nessa situação, seja compartilhando conhecimento e repassando esclarecimentos como esse que abordamos aqui, para que uma mudança seja feita. Digo isso considerando inclusive, conversar com meninas e meninos, crianças que ainda podem ter mais consciência de que um futuro melhor é possível.”, finaliza Tuane. 

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