Meu, seu ou nosso dinheiro?

Casar ou morar junto exige mais do que vontade e sentimento, é preciso também uma boa dose de organização financeira.
JOB_03_REDES_SOCIAIS_EQL_AVATARES_QUADRADOS_PERFIL_v1-02

Decidir se casar, ou morar junto com um parceiro ou parceira, não é uma decisão simples. Envolve o emocional, mudanças e, claro, planejamento financeiro. E como fica essa organização? O dinheiro deve ser tratado como algo coletivo, ou precisa estar bem separado? Para essa reflexão, nós ouvimos a opinião de duas especialistas em educação financeira, mas, antes, é importante trazer algumas informações interessantes.

Uma pesquisa realizada pela Onze, fintech de saúde financeira e previdência privada, revelou que um em cada quatro homens faz compras escondido da parceira ou parceiro. Entre as mulheres, uma em cada cinco faz a mesma coisa. E mais: no mesmo levantamento, a maior parte das pessoas que responderam que fazem compras escondidas têm um controle financeiro conjunto (28%). No teste de fidelidade financeira, muitas brasileiras e brasileiros não passam.

Um outro ponto que pode interferir diretamente no comportamento de um casal em relação às finanças são as diferenças salariais. Mulheres ganham 20,5% a menos do que os homens no país, comparando pessoas com a mesma faixa etária, grau de escolaridade e tipo de ocupação. A informação foi divulgada no início de 2022 pela IDados, uma consultoria que realizou a pesquisa a pedido do Portal G1. Para o levantamento, foi usada como referência a Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílio do IBGE (PNAD). Ainda de acordo com o estudo, o desemprego também é maior para elas. No final de 2021, dentre os 12 milhões de brasileiros desempregados, 6,5 milhões eram mulheres.

“Indiscutivelmente a questão financeira leva a situações de dependência psicológica, vulnerabilidade, podendo se tornar um ponto de discórdia. Não é possível falar em independência sem falar em dinheiro. A liberdade da mulher é diretamente proporcional a sua liberdade financeira. Ratifico a importância da quebra do tabu em relação a dinheiro. É preciso conversar a respeito. Há mulheres que são donas de casa por opção e está tudo certo. Assim como há mulheres que abrem mão de um salário melhor em troca de mais tempo para os filhos. Então, é necessário entender por que esta mulher tem o rendimento menor. Neste caso, justamente para não ser um ponto de discórdia, é importante ambos entenderem que trabalho doméstico também é trabalho e precisa ser valorizado”, explica a economista e consultora de inteligência financeira Dirlene Silva.

LEIA MAIS:

Dinheiro pode definir o sucesso de uma relação

A educadora financeira Luciana Fiaux reforça que casamento é uma sociedade, que não é feita só de dinheiro. Segundo ela, é importante que o casal tenha uma visão de parceria, entendendo que tudo o que entra é para aquela sociedade, onde os dois vão usufruir das realizações, não importando quem traz mais, já que ambos contribuem, gerenciam e realizam com aquele dinheiro.

“Assim como têm mulheres ganhando menos do que os homens, hoje em dia já vi casos de mulheres dizendo que ganham mais e isso acaba provocando desentendimentos. Quando a gente tem uma empresa e a empresa tem vários donos, investidores, alguns entram com dinheiro, outros entram com o trabalho. Então é importante criar no casal essa visão de parceria. Se eu estou entrando com menos dinheiro, onde eu estou entrando talvez com mais trabalho, com mais apoio? Qual é a minha contribuição para a gente criar um equilíbrio. É importante conversar bastante sobre isso”, explica Luciana.

Foto: Dirlene Silva

Conversar também é o que defende a economista Dirlene Silva. Ela lembra que, ainda que não tenhamos esse aprendizado na escola e raras famílias tenham o hábito de falar sobre o assunto, o dinheiro é parte do dia a dia, mas ainda é considerado tabu. Atualmente, o segundo maior motivo de divórcio no Brasil está relacionado exatamente ao dinheiro, porque gera também muitas brigas. Famílias disputam heranças e crimes são cometidos em nome do dinheiro e, mesmo assim, segundo Dirlene, as pessoas não falam a respeito.

“Quando há intenção de iniciar uma vida conjunta, deve-se entender que o dinheiro será compartilhado também! Para isto é essencial uma conversa franca sobre o rendimento de cada um e as despesas também. A partir daí, será possível definir as despesas que passarão a ser compartilhadas, como aluguel ou prestação da casa própria, alimentação, energia elétrica… Minha dica aqui é estabelecer um percentual da renda de cada um para cobri-las. Além das despesas, é importantíssimo ter um fundo para emergências e ter planos em conjunto. Então aí já está uma motivação para um planejamento financeiro do casal”, orienta Dirlene.

 Tenho que dar satisfação de tudo?

Não é bem assim, mas é importante que gastos que são individuais não comprometam o planejamento financeiro da família, seja ela com ou sem filhos. Se você é uma dessas pessoas que precisa esconder algo que comprou, como mostrou a pesquisa da fintech Onze citada no início desta reportagem, tem alguma coisa errada nessa relação.

“A chamada infidelidade financeira nada mais é do que mentira. Totalmente contraditório ao princípio do relacionamento entre casais, que deveria ser a confiança. Não é à toa que dinheiro é o principal motivo de brigas entre os casais. Novamente é o tabu! Não falamos sobre dinheiro e fingimos que está tudo bem. Lembro da piada que diz que antes de se casar é ‘meu bem!’ e, depois, passa a ser ‘meus bens’”, alerta Dirlene.

Parceria e confiança é o que Fernanda Klier exercita com o marido na gestão do dinheiro da família. Ela é pequena empreendedora, dona da Brownie da Brown, e trabalha com brownies sob encomenda para festas e eventos. Já ele, atua com tecnologia e é funcionário de uma empresa nacional. Para os dois, compartilhar e ter um propósito conjunto foi a melhor solução.

“Sempre foi o nosso dinheiro, nunca teve essa de meu dinheiro, ou seu dinheiro. Como ele tem um ganho mais alto, ele paga as contas principais, mas temos nossas independências para compras e gastos pessoais. A gente só conversa sobre gastos individuais quando são coisas mais caras. Por exemplo, ele quer comprar um instrumento musical, então ele sempre fala comigo, mesmo sendo com o dinheiro que ele recebeu. Se eu vou a um show mais caro, mesmo sendo com o meu dinheiro, também compartilho sobre o custo disso”, explica Fernanda.

Além de conversar e estabelecer uma parceria financeira durante o casamento, outra dica importante é entender como o parceiro ou parceira lida com o assunto antes de dividir o mesmo teto. Isso pode ajudar a evitar surpresas e desentendimentos, como alerta a educadora financeira Luciana Fiaux.

“Muitos casais deixam para falar de dinheiro só quando já estão casados, ou quando tomam a decisão de dividir a vida. Isso tem que acontecer desde o momento do namoro, no dia a dia, para entender como o seu parceiro lida com o dinheiro. É muito importante que você se una a pessoas que têm os mesmos valores pessoais que você e, dentro desses valores, tem a forma como lida com as finanças, porque fazer uma mudança depois de casado vai ser mais desafiador.”

Conta conjunta ou cada um na sua?

Para um casal ser parceiro nas finanças, ter uma conta conjunta não é uma condição, mas uma escolha. Luciana Fiaux lembra que esse tipo de conta era mais popular e até incentivado no passado, porque o dinheiro dos dois somados dava um peso. Com isso, o banco poderia dar acesso a benefícios e serviços extras, o que também exigia cuidado, já que diversos empréstimos têm juros altos e o cheque especial é perigoso. Além disso, ao longo das décadas, muita coisa mudou no sistema bancário brasileiro.

“Hoje em dia, com as contas digitais, mais serviços disponíveis e produtos de investimentos melhores, essa conta conjunta não se faz mais necessária. Muitos ainda enxergam a conta conjunta como forma de manter a vida conjunta do casal, mas não é a conta que determina se o casal está unido nas finanças. O que de fato determina é a forma como lida no dia a dia, o que é possível em contas separadas”, defende Luciana.

E essa fórmula também tem funcionado para a pequena empreendedora Fernanda Klier e o marido.

“A gente não tem conta conjunta, porque quando começamos a namorar já tínhamos nossas contas individuais e assim permanecemos. Se necessário, eu acesso a conta dele, como ele acessa a minha. Sempre que queríamos alguma coisa, a gente planejava e sempre tivemos prioridades. Tínhamos consciência de que se a gente queria como comprar nossa casa, por exemplo, tinha que economizar. A gente nunca discutiu por conta de dinheiro.”

O acesso à conta do parceiro ou parceira também deve ser uma escolha do casal, baseado na confiança e na organização financeira. E, para os casos de conta conjunta, a economista Dirlene Silva recomenda que seja determinado um gestor, para que haja um melhor controle.

“Por exemplo, foi determinado o valor que cada um contribuirá, assim como as despesas compartilhadas, bem como o fundo reserva para emergências e para planos futuros. A partir disso, mensalmente, um dos parceiros deposita o valor acordado na conta do parceiro gestor e este fará a gestão dos recursos. Pagando as contas e investindo os valores dos fundos de emergência e de projetos”, sugere Dirlene.

Mas, a economista lembra que não há certo, nem errado. O melhor caminho é o da conversa, definindo um modelo de gestão para a família, o que é endossado por Luciana Fiaux.

“Finanças não é só dinheiro, não é para ser sacrificante e se preocupar só com boleto, mas também está ligado à realização de sonhos. Então, é importante conversar sobre os sonhos, entender que lidar com dinheiro é fazer escolhas para conseguir realizar em conjunto”, conclui.

Fique por dentro de todas as novidades da EQL

Assine a EQL News e tenha acesso à newsletter da mulher independente emocional e financeiramente

Compartilhar a matéria:

×